Na época de Jesus, havia vários costumes e práticas ao redor da mesa. A refeição sempre começava com a bênção dos alimentos que unia as pessoas que partilhavam a comida como momento de comunhão com Deus e convívio social. A mesa representava o lugar da amizade onde compartilhava o alimento e fortalecia os laços familiares. O ato de lavar as mãos não era feito por questões de higiene, mas por motivos religiosos e cerimoniais, fazendo parte de um rito de purificação. Para a “justiça dos fariseus” era impensável sentar-se à mesa com pessoas consideradas pecadoras e impuras
É a partir deste entendimento que nós podemos olhar as leituras da liturgia de hoje. O evangelho mostra o chamado de Mateus, um cobrador de impostos que deixou tudo para seguir Jesus. Para os fariseus, os cobradores de impostos eram pecadores e considerados impuros. Pela sua própria profissão, o cobrador era colaborador do Império Romano que explorava o povo. Mateus não era um cobrador da classe elevada, pois dependia dos chefes do sistema de arrecadação que eram muito ricos. Mesmo assim, era preciso manter distância de acordo com a “justiça dos fariseus”. Apesar disto, Jesus se aproximou e chamou Mateus que, por sua vez, levantou-se imediatamente para o seguir.
A seguinte cena já fala de uma refeição ao redor da mesa na casa de Mateus. Além de Mateus, muitos cobradores e pecadores se sentaram à mesa junto com Jesus e seus discípulos. Para os fariseus isto era impensável e ficaram escandalizados: “Por que vosso mestre come com os cobradores de impostos e pecadores?” (Mt 9, 11). A resposta de Jesus mostra que Ele veio para ensinar o novo caminho onde os pecadores podem encontrar a misericórdia de Deus: “Aprendei, pois, o que significa: quero misericórdia e não sacrifício. De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores” (Mt 9, 13). Para Jesus, a justiça não vem pelos ritos de purificação, mas pela prática da misericórdia. A religião verdadeira não é de um ritualismo vazio e sem sentido muitas vezes praticado até nos dias de hoje, mas é o verdadeiro compromisso com o Reino e sua justiça.
O profeta Oseias também fala deste mesmo tema: “Quero amor, e não sacrifícios, conhecimento de Deus, mais que holocaustos” (Os 6, 6). Para Oseias, Deus não quer ofertas vazias que não correspondiam ao amor de Deus e a prática da misericórdia.
Quando olhamos para a prática de Jesus ao redor da mesa podemos descobrir vários ensinamentos. Primeiramente, a mesa é o lugar do chamado. O chamado de Mateus e o seguimento de Jesus levou à cena da mesa. A mesa se tornou lugar de comunhão com a vontade de Deus onde os alimentos e os frutos da terra são abençoados e partilhados como reconhecimento e gratidão a Deus. A mesa para Jesus também é o lugar onde as pessoas são acolhidas sem discriminação e preconceito. Assim, a verdadeira religião não é pela prática de ritualismos vazios e sem sentido, mas na misericórdia e compaixão que revelam o verdadeiro rosto do nosso Deus. Finalmente, a mesa se torna o lugar da amizade e convívio social. Não são partilhados somente os alimentos, mas a própria vida com suas dificuldades, sofrimentos e também suas alegrias. Com esta prática, Jesus transmitiu aos seus seguidores os valores essenciais para a vivência da fé.
Ainda nos nossos dias, a mesa nas famílias desempenha um papel crucial como um local de alimentação, comunicação, convívio social, educação, celebração e partilha. É um espaço para criar laços familiares e fortalecer os vínculos entre os membros da família. Ao mesmo tempo, podemos dizer que é o lugar de reconhecimento dos dons de Deus onde rezamos e agradecemos pelo alimento e pela vida. Por este reconhecimento, a mesa em nossas casas pode ser um lugar de seguimento de Jesus onde aprendemos a viver seus ensinamentos. Para isto acontecer, precisamos insistir que a refeição seja um momento de reunir a família para comer juntos, rezar em gratidão a Deus, conversar em família e partilhar não somente o alimento, mas também a própria vida de cada membro da família.
Podemos trazer esta experiência para a mesa da Eucaristia. Esta mesa não é o lugar de ritos vazios sem sentido, uma simples obrigação ou de uma religiosidade individualista onde procuramos satisfazer nossos desejos ou interesses pessoais. O alimento que partilhamos é a Palavra de Deus e o pão abençoado que recorda a memória de Jesus e do seu projeto de amor. Não somente chamados a seguir Jesus, mas aprender o significado deste seguimento e viver em verdadeira comunhão como irmãos e irmãs como membros da família de Deus. Como família nos reunimos, rezamos em gratidão a Deus pelos dons recebidos e compartilhamos a vida sem discriminação e preconceito. Podemos expressar tudo no nosso canto de comunhão: “Ó senhor, nós estamos aqui, junto à mesa da celebração, simplesmente atraídos por vós, desejamos formar comunhão! Igualdade, fraternidade, nesta mesa nos ensinais. As lições que melhor educam, na eucaristia é que nos dais!”
Por: Frei Gregório Joeright, OFM
Referências:
BORTOLINI, Padre José. Roteiros Homiléticos: Anos A, B, C, Festas e Solenidades. Brasil: Paulus Editora, 2014.
COSTA, Padre Antônio Geraldo Dalla. Buscando Novas Águas. Disponível em: https://www.buscandonovasaguas.com/index.php?menu=home. Acesso em: 03 fev. 2022.
A Fé Compartilhada – Pe. Luís Pinto Azevedo