Muitas vezes usamos a expressão: “a ficha caiu”. Esta expressão começou a ser usada antes da invenção do celular quando existiam telefones públicos em vários lugares onde as pessoas podiam fazer suas ligações. Uma vez que a inflação era tão alta e não existia moedas, era preciso comprar uma ficha para usar o telefone. Por causa da inflação, o preço da ficha mudava todas as semanas. A pessoa levava a ficha e colocava no telefone e a ficha ficava na entrada do buraco enquanto discava o número, quando completava a ligação e alguém atendia o telefone, a ficha caia e a gente podia conversar com a pessoa do outro lado da linha. As vezes a ligação era tão ruim que ninguém podia compreender o outro, mas não dava mais para recuperar a ficha. Usamos esta expressão de várias maneiras, especialmente quando uma pessoa finalmente consegue compreender uma piada, expressão ou um acontecimento.
No evangelho de hoje, Jesus fala: “É por isso que lhes falo em parábolas, porque olhando, eles não veem e, ouvindo, eles não escutam e nem compreendem. Desse modo, se cumpre neles a profecia de Isaías: `Havereis de ouvir, sem nada entender. Havereis de olhar sem nada ver. Porque o coração deste povo se tornou insensível´” (Mt 13, 13-14). Para que o nosso coração não seja insensível diante da Palavra de Deus, é preciso escutar e compreender com o coração. Em outras palavras, para sermos felizes porque “nossos olhos veem e nossos ouvidos ouvem”, é preciso que a ficha caia para completar a ligação entre nós e Deus.
Podemos dizer também que Deus mantem os canais de comunicação sempre abertos, como o profeta Isaias escreve: “Assim como a chuva e a neve descem do céu e para lá não voltam mais, mas vem irrigar e fecundar a terra, e fazê-la germinar e dar semente para o plantio e para a alimentação, assim a palavra que sair da minha boca: não voltará para mim vazia; antes, realizará tudo que for de minha vontade e produzirá os efeitos que pretendi, ao enviá-la” (Is 55,10-11). Deus não deixa de irrigar nossa vida para que sejamos transformados e renovados pela sua Palavra. Como a chuva cai na terra, é preciso que a palavra caia no nosso coração, ou, é preciso a ficha cair.
De fato, cada vez que uma semente germina é como um milagre. Uma pequena semente que tem uma casca dura pode virar uma grande árvore. Mas, para este milagre acontecer, é preciso ter as condições básicas e os nutrientes certos. É como na parábola quando Jesus fala que a semente caiu em vários terrenos. Umas sementes caíram na beira do caminho e os pássaros comeram. Outras sementes em terreno pedregoso, mas as plantas nasceram e foram queimadas pelo sol. Outras sementes cariam entre os espinhos que sufocaram as plantas, mas outras em terra boa e as sementes produziram na base de cem, de sessenta e trinta frutos por semente. Então, quando somos a terra boa podemos aprender e compreender a palavra semeada. Em outras palavras, para a ficha cair, é preciso não somente atender a ligação, mas deixar que a palavra penetre no chão da nossa vida, no coração. Precisamos ser a terra boa.
Quais são as condições para sermos esta terra boa? Quais os nutrientes que devemos misturar no chão da nossa vida para sermos terra boa?
Primeiro, é preciso ter a capacidade de ouvir, aprender e compreender. Nossas comunidades oferecem muitas oportunidades: nas celebrações, nas escolas bíblicas, na catequese de iniciação a vida cristã, nos nossos Núcleos de Fé. Podemos agir para que a semente possa germinar em nossa vida, fazendo o milagre da transformação onde podemos enfrentar as forças do mal, as preocupações deste mundo e a ilusão da riqueza.
Segundo, no compromisso comunitário onde juntos, como irmãos e irmãs, superamos as divisões e produzimos os frutos do reino: a justiça, solidariedade e partilha. Mesmo em tempos de dificuldades e desentendimentos, podemos promover o espírito comunitário quando reconhecemos nossa responsabilidade de vivermos unidos em comunhão. Neste domingo, inicia 15º Intereclesial das CEBs, com o tema: “CEB, uma Igreja em saída na busca da vida plena para todos e todas”. Vamos acompanhar este grande acontecimento da nossa Igreja como momento de renovação e compromisso das nossas comunidades e na fidelidade da escuta e da compreensão da Palavra de Deus presente no nosso meio.
Terceiro, na prática do amor e do perdão, pois somos capazes de vencer os egoísmos e interesses pessoais que podem nos sufocar e nos queimar não deixando a semente germinar.
São Paulo escreve: “Sabemos que toda a criação, até ao tempo presente, está gemendo como que em dores de parto. E não somente ela, mas nós também, que temos os primeiros frutos do Espírito, estamos interiormente gemendo, aguardando a filiação divina e a libertação para o nosso corpo” (Rm 8, 22-23). Para experimentar este renascimento no Espírito, precisamos lembrar que a Palavra de Deus é como a chuva e a neve que caem na terra e não voltam para Deus sem realizar a missão pela qual foi enviada. Queremos que esta palavra caia no chão da nossa vida para realizar o milagre de germinar a semente e produzir os frutos do Reino. Quando isto acontece não somente ouvimos, mas também aprendemos e compreendemos. E quando compreendemos a mensagem desta palavra, manifestando isso nas ações que praticamos no dia a dia da nossa vida, podemos então dizer que “a ficha caiu”.
Por: Frei Gregório Joeright, OFM
BORTOLINI, Padre José. Roteiros Homiléticos: Anos A, B, C, Festas e Solenidades. Brasil: Paulus Editora, 2014.
COSTA, Padre Antônio Geraldo Dalla. Buscando Novas Águas. Disponível em: https://www.buscandonovasaguas.com/index.php?menu=home. Acesso em: 03 fev. 2022.
A Fé Compartilhada – Pe. Luís Pinto Azevedo