“Eu sou o Senhor teu Deus que te tirou do Egito, da casa da escravidão” (Ex 20, 2). São estas as palavras que iniciam o relato dos 10 mandamentos no livro do Êxodo. Palavras que indicam que tipo de Deus em que nós acreditamos, e, ao mesmo tempo, nos explicam sobre o sentido dos mandamentos. Podemos dizer que é como um prego que é usado para pendurar um quadro na parede, sem o prego que sustenta o quadro, não podemos apreciar o que o artista pintou.
Por estas palavras, Deus se identifica como aquele que liberta da escravidão e quer a vida do seu povo. Ele é aliado aos que sofrem e liberta aos que são explorados e escravizados. Por isso, o quinto mandamento, que diz “Não matarás” (Ex 20, 13), é o centro dos dez mandamentos. Este mandamento não é somente uma proibição, mas muito mais um desafio para garantir a vida. Então, para o povo que saiu da casa de escravidão, da terra do Egito, acreditar num só Deus que liberta, significa lutar para preservar a vida. É como dois lados de uma só moeda: de um lado a fé, acreditar em Deus, e do outro, a luta para garantir a justiça e a vida para todos.
A partir desta reflexão é que podemos entender o evangelho de hoje. O templo era o centro religioso no tempo de Jesus, o lugar do perdão, reparação das faltas e do culto a Deus. Mas se tornou o centro da exploração com a venda de animais, o câmbio de dinheiro e a troca de favores. Jesus entra e expulsa os vendedores, derruba as mesas dos cambistas e lembra que a casa de Deus não deve ser uma casa de comércio.
Destas leituras, podemos aprender duas coisas. Primeiro, os discípulos recordaram a profecia: “O zelo por tua casa me consumirá” (Jo 2, 17b). É justamente o zelo de Jesus pelo projeto de Deus. Também para Jesus, acreditar no único Deus significa lutar pela vida, é garantir a dignidade de todos. Jesus se coloca contra todo tipo de exploração que também é violência contra a pessoa e desrespeito pela sua dignidade.
A segunda coisa é que Jesus se coloca no lugar do templo, Ele é a plena revelação de Deus. O novo mandamento de Jesus é o amor e o amor de Jesus se manifesta na sua morte e ressurreição. As palavras de São Paulo nos ensinam onde está a sabedoria de Deus: “Nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e insensatez para os pagãos. Mas, para os que são chamados, tanto judeus como gregos, esse Cristo é o poder de Deus e sabedoria de Deus” (1Cor 1, 23-24). O corpo ressuscitado de Jesus é o novo templo e é na pessoa de Jesus que encontramos o caminho para a vida que nos livra da maldade e do pecado.
Esta reflexão nos ajuda a compreender o sentido da quaresma. É tempo de conversão, se acreditamos em Deus, vivemos a fé pelo cumprimento dos mandamentos. O centro dos mandamentos é a vida, e o maior mandamento é o amor, o amor manifestado por Jesus.
É também tempo de penitência e lembrar que a vivência do amor não é um sentimento vazio, mas é o sacrifício que fazemos nos doando pelo outros. Na medida que fazemos a penitência e nos sacrificamos pelos outros, vivemos o amor.
É tempo de fraternidade. A Campanha da Fraternidade é oportunidade de romper com a intolerância e a indiferença que provocam a divisão e desigualdade, pois “Vós sois todos irmãos e irmãs”. Confessamos que em Cristo somos santificados no Espírito e, por isso, não há mais lugar para o racismo, para o ódio e para a discriminação. Renovados pelo compromisso batismal, queremos construir um mundo novo de diálogo, justiça igualdade e paz, conforme a Boa-Nova do Evangelho. Por isso, como cristãos e seguidores de Jesus, precisamos cultivar relações de amizade social, fraternidade e justiça entre o ser humano e a natureza, entre o ser humano e seus semelhantes e entre o ser humano e Deus.
Finalmente, lembramos que viver a nossa fé de cristãos é acreditar que, ao longo da história, Deus se identificou como Aquele que quer a vida: “Eu sou o teu Deus que te tirou do Egito, da casa da escravidão”. Apreciar o quadro dos dez mandamentos é zelar pela vida, viver a fraternidade e superar a violência, pois estes mandamentos “são mais desejáveis do que o ouro e suas palavras mais doces que o mel” (Sl 18, 11).
Por: Frei Gregório Joeright, OFM