ASCENSÃO DO SENHOR

Foto IIustrativa: Benjamin West

“O Senhor Jesus foi levado ao céu, e sentou-se à direita de Deus” (Mc 16,19)

Há cinco semanas celebrávamos com intenso júbilo a solene liturgia da Vigília Pascal, definida por santo Agostinho como a “mãe de todas as santas vigílias”[1]. No coração daquela noite santa, ecoou o anúncio que todos aguardávamos: “Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui” (Mc 16,6). Em cada Eucaristia celebrada, a comunidade proclama com grande alegria a Ressurreição do Senhor, na memória da sua bem-aventurada paixão, gloriosa ressurreição e a ascensão aos céus (IGMR, 79e).

Nas últimas cinco semanas, esse anúncio reverberou no coração comunidade, através da proclamação da Palavra de Deus na liturgia, especialmente nos relatos das aparições do Senhor ressuscitado aos discípulos e discípulas, e a sua comunidade reunida: Às mulheres, que depois do sábado foram ao túmulo para ungir o corpo de Jesus (Mc 16, 1-7); a Maria Madalena, que no primeiro dia da semana foi ao túmulo, bem de madrugada, quando ainda estava escuro (Jo 20,1-9); ainda a Maria Madalena, que o reconheceu quando Ele a chamou pelo nome (Jo 20 14-17); aos discípulos de Emaús, naquele mesmo dia da ressurreição (Lc 24,13-35); à comunidade reunida, estando com as portas fechadas (Jo 20,19-31); por fim, à beira do mar de Tiberíades, quando apareceu aos discípulos depois de uma noite frustrada por não conseguirem pescar nada (Jo 21, 1-19).

Nestes e em outros relatos, a comunidade é convidada a reconhecer a presença do Senhor ressuscitado, que ao se manifestar, a faz superar o medo, o fechamento e a insegurança, na acolhida do dom da Paz e da alegria. Ao mesmo tempo, ao soprar a força do Espírito Santo, Jesus abre a inteligência e os corações dos discípulos, para compreender aquilo que as escrituras falavam a respeito dele (Jo 24, 45).

Nos aproximando da conclusão do tempo pascal, a liturgia, no mistério celebrado, nos prepara para a solenidade da Ascensão do Senhor aos céu. A Ascensão do Senhor, celebrada quarenta dias após a Páscoa (At 1,3), assinala a conclusão da presença de Jesus no contexto histórico, ao passo que inaugura o tempo da Igreja.

No vaticano e em alguns países do mundo esta solenidade é celebrada no quadragésimo dia após a Páscoa, em uma quinta-feira, este ano 09/05, conforme prescrição do calendário Romano Geral. Já no Brasil, por questões pastorais e determinação da CNBB, a solenidade da Ascensão é transferida para o domingo seguinte, substituindo assim o sétimo domingo da Páscoa. A transferência dessa e outras solenidades para o domingo é favorecer a maior participação dos fiéis na celebração.

A liturgia da solenidade da Ascensão, introduz a comunidade no sentido do mistério celebrado. Os textos eucológicos menores[2] dão voz àquilo que está no íntimo do coração do discípulo, o desejo do ser humano de ser “elevado às realidades do céu” (oração sobre as oferendas), pois lá já se encontra a natureza humana (oração depois da comunhão), levada por Cristo às alturas celestes.

A liturgia da Palavra segue o ciclo trienal das leituras. A primeira leitura (At 1,1-11) e o salmo (46) são os mesmos para os três anos do ciclo de leituras. Como segunda leitura, para todos os anos do ciclo, se oferece um texto da Carta de São Paulo aos Efésios (1 17-23), porém, no ano B há a possibilidade de escolher uma leitura mais longa, sempre da Carta aos Efésios (4,1-13) e no ano C, além da Carta aos Efésios, pode-se escolher o texto da Carta aos Hebreus (9,24-28;10,19-23). O Evangelho segue a divisão sinótica para cada ano do ciclo trienal. Esse ano, será tomado do Evangelho segundo Marcos.

Do conjunto de leituras oferecidos para a solenidade da Ascensão, iremos no concentrar na primeira e no Evangelho, duas catequeses que trazem o relato da comunidade onde se descreve como aconteceu a Ascensão do Senhor.

Na leitura dos Atos dos Apóstolos (1,1-11), Lucas, escrevendo a um certo Teófilo[3], a quem destina suas duas obras, faz memória das aparições de Jesus à comunidade depois da ressurreição e as instruções dadas aos apóstolos antes do seu retorno definitivo ao Pai. O Espírito Santo, que será enviado como força do alto e fará dos discípulos testemunhas até os confins da terra (1,8), de tudo o que viram e ouviram. Chama atenção o modo como Lucas narra a cena, com elementos que caracterizam uma manifestação teofânica.

Aos apóstolos, que atônitos continuavam a olhar para o alto, os “homens vestido de branco” (1,10) perguntam: “por que ficais aqui, parados, olhando para o céu?” (1,11), em clara alusão de que, a partir de daquele momento, é através da comunidade, no anúncio e no testemunho da Palavra de Deus, que o Senhor Jesus continuará vivo e atuante no mundo.

O Evangelho traz a perícope conclusiva do texto segundo Marcos (16,15-20), adicionada posteriormente para dar maior coerência a narrativa evangélica. O relato mostra Jesus ressuscitado, que se manifesta aos onze. O texto destaca o envio missionário dos discípulos para anunciar “o Evangelho a toda criatura” (16,15), colocando em evidência os sinais que tornarão visíveis a ação do Senhor e acompanharão aqueles que crerem (16,17). O relato evangélico se conclui com a subida de Jesus, levado ao céu, e o início do anúncio missionário por parte dos discípulos.

A solenidade da Ascensão marca a conclusão do percurso histórico de Jesus que, levado ao céu sentou -se à direita de Deus (Mc 16,19), e o início da história da Igreja no mundo. De modo nenhum o Senhor quer deixar órfã a sua comunidade ou, como ressalta o prefácio da solenidade, abandonar ou afastar-se da nossa humildade. Pelo contrário, ao ser levado ao céu Jesus assegura que um dia também lá chegaremos, pois elevou consigo a nossa humanidade.

Cabe a todos os batizados e batizadas, discípulos e discípulas do Senhor ressuscitado, dar continuidade a missão por Ele iniciada, anunciando o Evangelho da vida e de salvação, testemunhando o Reino de Deus no meio do mundo.

 

Frei John Araújo, OFM

[1] “Mater omnium sanctarum vigiliarum”. Cf.: Agostino d’Ippona, Sermo 219, I: PL 38, 1088.

[2] oração coleta, oração sobre as oferendas e a oração depois da comunhão

[3] Do grego θεόφιλος, que significa “amigo de Deus”, ou ainda, “amado por Deus”.

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