Custódio recorda presença da Irmã Arimatéia na Missão Cururu

Foto: Arquivo Custodial

Na manhã da terça-feira, 19 de setembro, recebemos a notícia do falecimento da Ir. Arimatéia, que estava em Fortaleza, no Ceará, na casa “Saudinha”, onde as irmãs idosas e enfermas são cuidadas. Ir. Lioneide entrou em contato conosco para comunicar a páscoa desta grande missionária das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição.

As minhas recordações da fisionomia da Ir. Arimatéia são da década de 1990, quando visitei pela primeira vez a Missão São Francisco do Cururu. Ela já tinha uma certa idade, mas manifestava um grande vigor em sua presença na Missão. Sua fisionomia de mulher nordestina forte me fez lembrar de minha avó materna, que também era nordestina e era uma mulher forte e lutadora. Aquela imagem da Ir. Arimatéia ficou impressa de modo indelével em minha memória. Os nossos irmãos Munduruku do Cururu, especialmente da aldeia da Missão, testemunharam a passagem de grandes missionárias e missionários franciscanos ao longo de mais de cem anos. Admira-nos muito hoje a generosidade, o despojamento, a disposição, a dedicação total destas religiosas e religiosos que não desejavam nada para si mesmos, pareciam não ter ambições pessoais nem nenhum tipo de apego, nem mesmo à própria vida. Ir. Arimatéia, como outras irmãs e alguns dos confrades missionários, dedicaram décadas de suas vidas nesta missão. Ela mesma, mais de quarenta anos. A Ir. Conceição – querida “Concita” -, que hoje está em tratamento de saúde em Fortaleza, também passou uns quarenta anos na Aldeia. Frei Plácido teria passado ali sessenta anos de sua vida. Frei Gilberto, uns vinte anos. E poderíamos citar outros irmãos e irmãs que dedicaram boa parte de suas vidas nesta missão entre os irmãos Munduruku do Alto Tapajós e Cururu.

Foto: Arquivo Custodial

Ir. Arimatéia, como tantas outras pessoas que doaram grande parte – certamente a melhor parte – de suas vidas na missão, são pessoas que levaram muito a sério as palavras de Jesus: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois, quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas quem perde a sua vida por causa de mim e da Boa Notícia, vai salvá-la.” (Mc 8, 34-35). Este “salvar” não se contabiliza em números de anos que alguém passou na missão, mas na qualidade e na densidade e intensidade do tempo passado e doado na missão. Não precisa ser necessariamente um longo período, mas um tempo qualificado pelo testemunho de vida. No breve tempo que nos é dado viver podemos fazer muitas coisas, mas o que permanece de nós, senão o que fazemos de bem e de bom? Prova-o o discurso do julgamento final, em Mateus 25, 31-46: o que nos salva é o altruísmo, o amor que mobiliza. A nossa capacidade de sair de nós mesmo, de nos desapegarmos das falsas seguranças e nos lançarmos no serviço do outro. Vejo nos exemplos dos missionários como a Ir. Arimatéia a radicalização deste amoroso altruísmo. O espírito missionário morre quando as pessoas não conseguem mais sair de si mesmas  e não têm mais a capacidade da renúncia de si mesmas.

No livrinho “Código de Ética”, elaborado pela “Aliança Francisclariana”, selada entre a Custódia São Benedito da Amazônia e as Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição (SMIC),  publicado em 2007, Ir. Arimatéia dá um longo testemunho de sua experiência de vida na Missão São Francisco, ao longo dos 43 anos que passou na Aldeia, entre o povo Munduruku.  É bonita a narrativa de sua história na missão, iniciada em dezembro de 1955, com a longa viagem para chegar à Aldeia de São Francisco do Cururu. Não havia estrada, nem aviões, nem a rapidez dos carros de hoje, mas o transporte fluvial bem mais lento do que os barcos e lanchas rápidas dos nossos tempos. Uma viagem que hoje se pode fazer em quatro ou cinco dias, naqueles anos levava algumas semanas, como nos conta com simplicidade a Ir. Arimatéia em seu relato da primeira viagem ao Rio Cururu. Quantos sacrifícios, incômodos, cansaço, sofrimentos e outros desafios os missionários e missionárias enfrentavam para chegar ao Cururu!

O exemplo de vida da Ir. Arimatéia nos inspire hoje para continuarmos a presença missionária, fraterna, dedicada à missão junto às aldeias do povo Munduruku. E aprendamos com ela e todos os missionários e missionárias que deram toda a vida ou parte dela, com total e generosa entrega, à esta missão que nos foi confiada há mais de um século. Obrigado, Ir. Arimatéia, por sua doação generosa e testemunha como pessoa consagrada e missionária a serviço dos povos indígenas!

Ir. Arimatéia do Vale  – 1924 – 2023

Frei Edilson Rocha, OFM

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