
Foto: Arquivo Custodial
Quando o fim do ano se aproxima as leituras da liturgia ganham a temática do final dos tempos. Esse fim que se aproxima nos leva a pensar sobre o destino da humanidade e da Casa Comum. Esse tema faz ainda refletir sobre “a novidade” que virá. E justamente é essa realidade nova que anseia profundamente toda a Criação.
Diante das preocupantes realidades das mudanças no clima que afetam o mundo e de forma particular a Amazônia, também nos colocamos a pensar no fim. Por muito tempo pensou-se que a região amazônica era fonte inesgotável, fato que hoje já não se sustenta. Cenas de destruição e de consequências da elevação da temperatura da Terra parecem aludir para uma verdadeira queda do céu. As sabedorias ancestrais da região Amazônica têm várias interpretações para o “fim dos tempos” e para o fim de cada pessoa, e essas escatologias dialogam também com aspectos da compreensão cristã.
Frente a essa dura realidade nos colocamos não na atitude de profetas do desespero, mas de anunciadores da esperança. Nossa certeza de que a vida é maior não nos faz ter olhos fechados para as realidades presentes, nem nos deve deixar tomar de conta o medo que paralisa. Nesse contexto, urge uma esperança transformadora, que busca fazer jus a esse futuro que vem, como postula o teólogo Moltmann (2012). É essa esperança de um mundo alternativo que alimenta o sonho da transformação já aqui, como podemos ver expresso de forma concreta nas páginas de Querida Amazônia.
O poeta amazonense Thiago de Mello de algum modo em seus poemas expressa uma escatologia. Fala em um de seus poemas, que inclusive é citado em Querida Amazônia, sobre o medo de que a Amazônia “esteja tomando o rumo do fim” (Mello, 2023, p. 68). Também em pátria das águas o poeta apresenta o verso do filho da floresta que ajuda na construção da morada futura, que liberta os verdes da servidão. Evidente que o poeta não fala apenas de uma “outra vida somente no além”, mas da outra vida possível aqui. Ao mesmo tempo que seus poemas são tomados de uma esperança comprometida. O olhar da própria Amazônia que “sente precisão de amor” (Mello, 2023, p.103), que grita e geme aguardando a manifestação dos filhos e filhas de Deus.
O “fim” nos faz pensar ainda em finalidade, para onde e por qual motivo tudo se destina. Acerca da finalidade da Amazônia e dos seus povos, podemos afirmar a certamente que este destino não é a exploração que tem sido contemplada. A Amazônia não tem como fim ser lugar de exploração e de destruição. No entanto, muitos só enxergam esse caminho para a Amazônia e não percebem que tomam a via da degradação. Por outro lado, o rio do Reino de Deus e o sonho do bem viver apontam para outros possíveis finais.
A encíclica Laudato Si’ (Francisco, 2015, n. 243-245) recorda que “no fim” junto com toda a Criação, que terá parte conosco, contemplaremos a beleza infinita de Deus. E ainda, recorda que o que há de bom é assumido no festim da eternidade. Não obstante a séria necessidade de lutar para defender a Amazônia, as preocupações não devem nos furtar a alegria e a esperança. Enquanto aqui buscamos o bem viver, que se plenifica no novo céu e nova terra, vivemos os valores do Reino, que é um “futuro presente”.
Frei Fábio Vasconcelos, OFM
Referências:
FRANCISCO. Laudato Si’. Disponível em: <https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html >. Acesso em 31 out. 2023.
FRANCISCO. Querida Amazônia. Brasília: Edições CNBB 2020
MELLO, Thiago. Mormaço na Floresta. São Paulo: Global, 2023.
MOLTMANN, Jürgen. Ética da Esperança. Petrópolis: Vozes, 2012.