A imagem fascinante da floresta, seja vista de cima ou por dentro, nos serve como um ícone da ministerialidade eclesial. Ao falar dos ministérios com rosto amazônico, voltamos o nosso olhar para a variedade natural presente na Amazônia. A hileia também é um lugar de sonhos, de inspiração poética e da produção do imaginário, como nos recorda Loureiro (2015).
As matas amazônicas têm sido lugar da palavra e do silêncio, e igualmente do grito da Terra e dos pobres. As árvores, desde as pequenas até o colossal angelim-vermelho, sintetizam sinais de vida e uma “simbologia teocêntrica”. A árvore cresce em sua copa para o céu ao mesmo tempo que finca suas raízes na terra.
Cristo no seu ministério se identificou como a planta da qual somos os ramos, e os ministérios podem ser vistos como essa ramificação em Cristo para produzir frutos. A seiva de vida preenche os servidores do Reino. Tal como o alimento é necessário para que a planta não desfaleça, assim também os ministérios precisam constantemente nutrir-se de Cristo. A necessidade de ministros que alimentem o povo é grande e isso foi bem pontuado no sínodo pan-amazônico.
O Espírito é que faz florescer na Igreja os ministérios que são serviços com base nos carismas. Então o sopro do ar do Espírito, temos como na vida vegetal uma geração de vida no diálogo. Em Spiritus Domini (FRANCISCO, 2021), podemos ler: O Espírito do Senhor Jesus, fonte perene da vida e missão da Igreja, distribui aos membros do Povo de Deus os dons que permitem a cada um, de modo diverso, contribuir para a edificação da Igreja e para o anúncio do Evangelho.
Em Antiquum Ministerium (AM, 2. FRANCISCO, 2021), observamos: Os carismas, que o Espírito nunca deixou de infundir nos batizados, tomaram em certos momentos uma forma visível e palpável de serviço à comunidade cristã nas suas múltiplas expressões, chegando ao ponto de ser reconhecido como uma diaconia indispensável para a comunidade. Nessas palavras recordamos a fecundidade e unidade ministerial emanadas do Espírito Santo. Desse modo podemos dizer que o Espírito é a força que faz crescer a diversidade e garante a unidade dos serviços eclesiais. E os ministérios atuam cada um pela graça e inspiração do Divino.
A Amazônia não é um “verde único de floresta”, mas uma pluralidade de cores, outra imagem da diversidade rica de ministérios. Temos uma biodiversidade que não é monolítica, mas criativa, viva. A Amazônia é um poliedro de culturas e ambientes. A região é heteróclita, um espaço fértil para acolher uma diversidade ministerial. Assim como toda planta brota e dialoga em um solo, os ministérios amazônicos devem ser encarnados na realidade, e os ministros devem ter profundo senso comunitário, além de poder conversar com as culturas locais.
A ministerialidade cristã tem sua semente (origem) e luz (força) na Palavra e na Eucaristia. Se recordarmos que os ministérios têm seu fundamento no sacerdócio batismal dos fiéis, logo nos vem à memória a expressão neófito, que significa nova planta. Também a compreensão desses ministérios é a de seguimento e amadurecimento, como as plantas, que se expandem. Assim como as folhas caem e a planta se renova, os ministros precisam buscar renovar seus conhecimentos e dialogar com os sinais dos tempos.
Os ministérios têm seu centro em Cristo e suas raízes são a comunicação com as tradições eclesiais e culturais de cada lugar. A Igreja latina por séculos tem confiado aos fiéis os ministérios ordenados e laicais. Os ministérios “são reconhecidos e instituídos pela Igreja, são postos à disposição da comunidade e da sua missão de forma estável” (Spiritus Domini, 2021). Todo serviço litúrgico é igualmente um auxílio para celebrar bem e para a participação ativa, plena e frutuosa do povo de Deus. As árvores também são abrigo, lugar de encontro, oferecem sua sombra aos que precisam, e essa ideia também deve transparecer nos ministérios amazônicos, que devem estar prontos para a acolhida.
“Na floresta, uma planta nunca cresce sozinha” e do mesmo modo nenhum mistério é mérito e prêmio que isola as pessoas. As árvores são espaço para o anúncio e canto dos pássaros e outros bichos. A relação com as plantas também estabelece um estilo de vida, por exemplo aquele que coleta castanha, ou látex e que recebe um nome de “castanheiro” ou seringueiro e vive nessa relação com os ciclos das plantas. Esses são ofícios que marcam a vida de quem os executa, geram um modo de viver. O testemunho pode ser figurado pelo reconhecimento dos frutos da árvore. Isso tudo nos lembra que para os ministérios precisamos de formação e acompanhamento, ou seja, o substrato, o húmus, que faz a planta crescer viçosa.
As folhas das plantas são remédios que curam, e que a sabedoria milenar dos indígenas bem conhece, assim são os ministérios que devem ser alívio e selo pelo bem de todos. Os frutos e alimentos da Palavra nos vemos nas comunidades cheias de fé e vida, que buscam construir o reino, e que se unem diante de tantos desafios. Os diversos ministros, ordenados ou não, são o rosto da comunidade e não devem ter uma oposição como se fossem desenraizados do ambiente. Essa pluralidade ministerial representa a Igreja servidora.
Os próprios ministérios da liturgia não devem encerrar-se ou serem vistos como algo desconectado da vida. A ideia de ecologia ministerial, nesse paralelo com a floresta, deve nos permitir ver que também os servidores devem estar interligados entre si e mais ainda com Cristo. Ministérios inculturados, ou enraizados, não sinais de uma Igreja de presença não só “de passagem”. Esse “renovo ministerial” com rosto amazônico deve fazer brotar: “ministros que possam compreender a partir de dentro a sensibilidade e as culturas amazônicas”. Assim, como a flora amazônica tem riquezas para o mundo ainda “desconhecidas”, vemos que dessa realidade podemos germinar ministérios inculturados no plano litúrgico, do anúncio e da caridade.
Vemos que a semente dos novos caminhos lançada no Sínodo para a Amazônia tem germinado iniciativas como a abertura de ministérios instituídos de leitores e acólitos e do ministério de catequista, uma prática reconhecida do que já frutifica em muitas comunidades amazônicas.
A sensibilidade para perceber, acolher e suscitar novos ministérios é como aquela habilidade do agricultor que lança o olhar sobre o terreno. Precisamos ver na Amazônia a existência de certos ministérios do povo, tais como parteiras, ministros da bênção, lideranças de projetos ecológicos, animadores de comunidade, que se associam pelo batismo ao Cristo, sacerdote, profeta e rei. Um serviço pastoral, caritativo e pastoral como o das parteiras poderia muito bem associar-se com a pastoral catequética e preparação para o batismo, o título de um exemplo.
A muito tempo se fala nos documentos das Igrejas locais de ministério do pastoreio de comunidades, ou de leigos e leigas que possam presidir as celebrações e articular a vida pastoral. Temos presente o grande número de ministros leigos e leigas que presidem a celebração da palavra, ministros do batismo, assistentes do matrimônio, aconselhamento. Esperamos com isto, contribuir um pouco, regar mais o solo, com essa reflexão ainda germinal, mas com raízes em longos temas pensados e essenciais para a Igreja em seu serviço de missionário. Que floresçam no coração da Amazônia e em toda comunidade dos servidos do Reinos muitos ministérios.
Por: Frei Fábio Vasconcelos, OFM
REFERÊNCIAS
LOUREIRO, João de Jesus Paes. Cultura Amazônica: uma poética do imaginário. Manaus: Valer, 2015.
PAPA FRANCISCO. Querida Amazônia: exortação apostólica pós-sinodal ao povo de Deus e a todas as pessoas de boa vontade. Brasília: Edições CNBB, 2020.
_______. Spiritus Domini: Sobre a modificação do cân. 230 § 1 do Código de Direito Canônico acerca do acesso das pessoas do sexo feminino ao ministério instituído do leitorado e do acolitado. Disponível em: < https://www.vatican.va/content/francesco/pt/motu_proprio/documents/papa-francesco-motu-proprio-20210110_spiritus-domini.html>. Acesso em:12.jan.2022.
_______. Antiquum ministerium: pela qual se institui o Ministério de Catequista. Disponível em: < https://www.vatican.va/content/francesco/pt/motu_proprio/documents/papa-francesco-motu-proprio-20210510_antiquum-ministerium.pdf>. Acesso em: 12.jan.2022