Após o Sínodo da Amazônia, o primeiro passo foi esperar a Exortação Apostólica “Querida Amazônia” com as expectativas de certos setores, como por exemplo os ministérios dos padres casados e o diaconato para as mulheres. A segunda etapa foi a promulgação, propriamente dita, da Exortação em fevereiro de 2020. A partir daí iniciou-se a terceira etapa, animada pela REPAM (Rede Eclesial Pan-Amazônica): a divulgação dos documentos, a produção de materiais para estudo e aprofundamento e o processo de aplicação de suas conclusões.
Infelizmente não contava-se com um grande entrave neste processo: O Covid-19. Em março de 2020 chegou a pandemia e com ela o fechamento de atividades religiosas, sociais, comerciais, educativas, culturais e econômicas entre outras. No entanto, este foi um momento de reorientação e de ação. Foi necessário trabalhos de ações de solidariedade como a distribuição de cestas básicas para as famílias carentes, orientações sobre os cuidados com a saúde e a luta para que os órgãos dos Estados se fizessem presente de maneira eficaz, nas regiões já negligenciadas, da Amazônia continental. Neste intuito, a REPAM-Brasil lançou a Campanha internacional e nacional “Amazônia precisa de você”, para arrecadar recursos que servissem para atender as pessoas em necessidade extrema.
Mesmo com a pandemia, o trabalho não parou. O processo de preparação, realização e aplicação do Sínodo tem manifestado várias mudanças de comportamento em relação à Igreja e às sociedades Amazônicas.
No âmbito internacional já é possível observar algumas mudanças, como o processo de escuta e de consulta colegiada que tem animado muitos grupos da Igreja na Europa e Estados Unidos da América. Além disso, tem aumentado muito a solidariedade com a Amazônia e seus povos, tanto dentro da Igreja como da sociedade civil, por tudo o que a Amazônia representa para o mundo, sobretudo, em termos de meio ambiente.
O processo pós-sínodo também favoreceu ações como a “Primeira Assembleia Mundial pela Amazônia” em julho de 2020. Destaca-se como parte da assembleia mundial, ações diante da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, Organização de Estados Americanos, a pressão de governos do Norte sobre o governo brasileiro para que implemente políticas de preservação da Amazônia e contra políticas do atual governo que destroem o meio ambiente e os povos da Amazônia.
Outras ações ainda fazem fazem deste processo: a “Campanha Amazoníza-te” em julho de 2020; o “Plano de vida para salvar Amazônia” em fevereiro de 2021. A criação da Conferência Eclesial da Amazônia, CEAMA na sua primeira assembleia plenária, 26-29 de junho de 2020; e a continuidade do estudo da criação de uma Universidade Amazônica em 19 de outubro de 2021.
Em âmbito nacional tanto em setores progressistas na Igreja como na sociedade brasileira tem crescido a consciência da importância da Amazônia para o equilíbrio climático do sul do Brasil e da América do Sul. Percebe-se ainda o aparecimento e/ou fortalecimento de muitas iniciativas de proteção do meio ambiente, de práticas agroecológicas, de tratamento do lixo doméstico, de fortalecimento da agricultura familiar, etc. Algo muito positivo que pode ser notado é o crescimento da solidariedade com a luta dos povos indígenas diante os ataques do atual governo central.
Além disso, têm-se fortalecido a atuação da REPAM como rede de articulação presente nas várias arquidioceses, dioceses e prelazias, e têm-se iniciado programas de formação continuada para os comunitários. Destaca-se as várias campanhas organizadas pela REPAM-Brasil:
“Amazônia precisa de você”, para arrecadar doações para as populações carentes na pandemia;
“A Vida por um Fio”, para proteção comunitária de defensores/as de direitos humanos ameaçados;
“Amazoníza-te” para que o sentido da Amazônia faça parte de modo de sentir, pensar e agir das pessoas e dos grupos, deixando um comportamento colonialista;
“Os direitos da Natureza” para criar uma consciência dos direitos que tem todos os elementos da natureza e se crie leis que os reconheça e exija o seu cumprimento.
Acompanhando estas experiências comunitárias e as práticas formativas estão os “mini cursos” sobre ferramentas de comunicação, de gestão, de agroecologia, de proteção comunitária de defensores de direitos humanos ameaçados. Estão também as “caravanas formativas” de abril a agosto de 2021, sobre as cinco conversões e os quatro sonhos de que nos falam os documentos do Sínodo; os materiais da “cesta amazônica de formação” lançada em maio de 2021.
É importante destacar que durante a pandemia da Covid-19 a CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, fez vários pronunciamentos em favor da democracia, de políticas de enfrentamento à pandemia, contra os projetos de lei que permitem a exploração de minerais em terras indígenas e a legalização de terras públicas griladas… Postura profética dos Bispos do Brasil, esperada por grande número da população e da igreja.
Se por uma lado percebe-se um apoio maior aos povos da Amazônia, por outro tem crescido os ataques aos povos indígenas e às comunidades tradicionais nos seus territórios, assim como tem crescido a grilagem, as queimadas e incêndios e o desmatamento nestes dois anos de 2020 e 2021, quando se tem aproveitado para “fazer passar a boiada”.
No âmbito local de cada arquidiocese, diocese e prelazia, com suas paróquias e comunidades têm surgido muitas iniciativas de promoção da agricultura familiar agroecológica em todas suas diversas formas, hortas comunitárias, formação de guardiões ambientais, escolas de fé e cidadania, criação de experiências de economia solidária, etc. Nota-se que em várias dioceses se estão fazendo experiências de inculturação da fé cristã formando ministros leigos indígenas (Itaituba e Alto Solimões por exemplo), com mudanças na celebração da Missa (São Gabriel da Cachoeira por exemplo). Estas experiências locais foram socializadas nos encontros de “Formação de multiplicadores do Sínodo” de 23 a 31 de março de 2021, realizados em cada um dos seis Regionais da Amazônia Legal Brasileira. Aí se dispuseram todos os materiais digitais da REPAM-Brasil.
Este conjunto de ações e processos em andamento manifestam as mudanças produzidas pelo Sínodo. Mudanças de consciência e de comportamento, mudanças pessoais e coletivas, mudanças locais, regionais, nacionais e internacionais, mudanças positivas e reações negativas. As ações são realizadas nos 06 regionais da CNBB na Amazônia brasileira, pelos 16 comitês locais e os 06 eixos de atuação. Evidentemente que as mudanças não se dão em todas partes e no mesmo grau. Tem igrejas particulares (diocese, prelazias, arquidiocese) e regionais que têm incentivado as mudanças propostas pelo Sínodo e tem outras que não.
Com a preparação e realização do Sínodo da Amazônia, como fruto da Laudato Si’, se tem visto o que pode fazer a Igreja Católica com todos os seus organismos e presenças, se trabalha em rede, com clareza de objetivos e com um ente articulador. É de esperar que cresça essa mística de articulação e de evangelização ecológica integral para seguir enfrentando, junto com outras pessoas e grupos de boa vontade, a emergência em que se encontra a Amazônia e seus povos e comunidades.
Pe Guillermo Antonio Cardona Grisales, SJ.
Coordenador do Comité REPAM em Santarém