Segunda parte do relato da experiência do Frei Bruno Laviola na Missão Cururu

 

A subida do Rio até à Missão

A terceira etapa seria num outro carro alugado que nos levaria até o ramal do Bena para aí sim, pegar a voadeira e ir em direção à Missão Cururu. Então pensei  com meus botões que era impossível levar tudo aquilo numa voadeira, mas fiquei quieto até porque não conhecia nada. Quando avistei numa descida o falado ramal, meu coração bateu num compasso bem diferente. Um sentimento de paz estava comigo e alguém muito especial para mim veio à minha mente. Meu pai, Sebastião Canoa, o seu apelido famoso pelas terras de São Francisco do Glória na Zona da Mata. Pai faleceu há um ano, mas sempre nestes caminhos que percorri neste tempo de vida franciscana ele gostava que ao retornar sempre numa ligação pelo WhatsApp lhe contasse tudo. 

Ali percebi que não mais precisava ligar na volta para Minas Gerais, mas poderia falar com ele ali mesmo, era só fechar os olhos e trazer a memória daquele homem que soube me amar do seu jeito peculiar. Organizamos tudo e o Capitãozinho deu a partida no motor. Frei Edilson puxou a oração e como de costume rezou a oração do Anjo da Guarda. Foi difícil segurar as lágrimas. Quanta alegria de estar ali, naquele lugar em especial. As conversas, os lanches, as paisagens que se misturavam junto ao reflexo da água, cenas que eternizaram em meu ser. 

Não é fácil ficar numa lancha por horas, o sol que não dava trégua, a água que foi ficando um pouco morna, mas, de vez em quando, uma nuvem se achegava para dar um pouco de trégua. Assim foi a subida. Ao anoitecer, que magia nos aguardava; na falta dos smartfones, tínhamos um universo inteiro para avistar. Quanto tempo não parava para ver o céu, ver as estrelas, talvez possa parecer bobagem o que falo, mas em tempos de agora, onde não conseguimos mais parar, ter essa possibilidade é maravilhoso.

A chegada na Missão foi bem à noite e o cansaço já batia em meu corpo, e creio que dos confrades também. Teríamos uma última missão para o dia. Carregar as caixas, máquina de costura e tudo que estava na voadeira. E de repente, luzes vinham ao nosso encontro, um, dois, três, quatro e foi se multiplicando para a saudação e nos ajudar com as coisas. Agradeci a Deus e aos irmãos pela ajuda. 

Os dias na Missão Cururu

A semana passou rápido e vivida de forma muito intensa. Minha vontade era poder ficar mais um tempo, porém, já era tempo de voltar aos nossos afazeres. Experiência única que me trouxe sentimento de partilha e generosidade vivida entre eles. Alegria e diversão dos pequenos, força e empenho dos guerreiros e uma sensibilidade e preocupação dos líderes e dos mais velhos para com o povo Munduruku, sem falar das mulheres que ficaram por conta dos alimentos, quanta força e empenho. 

Não posso deixar de citar a alegria de Irmã Cláudia e sua vivacidade e garra pela missão. Me lembrei das grandes mulheres citadas ao longo dos livros bíblicos. Juntamente com a Irmã também a presença fecunda e alegre da aspirante Luciana, que muito me ensinou nas partilhas que tivemos. 

A experiência na enfermaria da Missão foi algo de muito aprendizado. Em meus trabalhos na área da saúde, com atuação de técnico em enfermagem e agora na finalização da graduação em enfermagem superior, sempre andei por locais onde mesmo com a má distribuição de verba para saúde, pouco faltava material de trabalho. E quando falamos de saúde particular, feita nos moldes de plano de saúde talvez até possa sobrar material, mas, sempre tenho comigo que não aprendemos de verdade a lidar com a escassez e mesmo assim conseguir dar dignidade ao tratamento porque ali, o pouco que tem, e contando sempre com a graça de Deus e sua providência se consegue ver o milagre. 

 

 

 

Hora de voltar com coração agradecido

O retorno foi uma experiência de medo e força. Ter coragem para seguir mesmo que o caminho não seja o escolhido por mim mesmo. Estar naquele bimotor não foi fácil não! Sentimento de coragem e novamente cito o tesouro da vida franciscana, a fraternidade, que não é fácil, mas que em muitos momentos se torna o que me falta. Tenho muito medo de voar, em aviões maiores ainda sigo numa boa, agora, nestes pequenos foi na força da superação. Lembro que quando entrei e Frei Jailson já estava sentado lá atrás, pensei, agora já estou aqui, vamos lá. Um por um e ao dar a partida, a sensação foi realmente de tantos desafios já superados e daria conta de mais um. Frei Diogo sorria e tentava de algum modo contribuir para que eu ficasse mais calmo. O piloto foi um mestre, passava segurança e conhecimento. Contudo, ainda prefiro a voadeira e sentir meus pés (kkkk).
Agradeço muito a Deus a possibilidade deste tempo de graça, tempo de estar mais profundamente vivendo e aprendendo novamente a confiar na sua providência e dela poder dar testemunho. Em poucas linhas faço memória de minha visita juntamente com Frei Rômulo a comunidade dos freis em Monte Alegre. Agradeço a hospitalidade e o passeio com Frei Gregório à Terra Preta, lugar muito bonito com seus pomares de frutas e até pés de café. 

Muito obrigado aos confrades da Custódia São Benedito da Amazônia por esta rica experiência em vosso meio. Deus vos abençoe e a todos os que de vocês se acercam nos trabalhos e conquistas em terras de graça.

Texto e Fotos: Frei Bruno Laviola, ofm 

 

Confira mais fotos da visita:

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