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O abraço de Francisco a indígenas brasileiros no Vaticano

Depois de inúmeros testes Covid-19 e quarentena de dez dias, duas lideranças indígenas do Pará participaram no Vaticano de um encontro do Movimento Laudato Si com o Papa Francisco.

Papa Francisco encontra a Delegação do Movimento Laudato Si – Foto: Vatican News

Na manhã desta quinta-feira, 26, o Papa Francisco recebeu na antessala da Sala Paulo VI uma delegação do Movimento Laudato Si  (até 29 de julho chamado Movimento Católico Global pelo Clima), que tem o foco de suas atividades na ecologia integral, mas também o compromisso internacional e constante inspiração de ação na Encíclica do Papa o sobre o cuidado com a Casa Comum.

Duas lideranças indígenas do Pará presentes no encontro – Cacique Dadá Borari e Poraborari, da terra indígena Maró, município de Santarém, oeste do Pará – contaram que o Papa Francisco dançou o Surara – somos guerreiros, eu sou guerreiro – e na conversa deu a eles “uma esperança muito boa” As lideranças acompanham a movimentação em torno da votação do marco temporal pelo STF nesta quinta-feira, mas também falaram sobre os inúmeros testes realizados antes de chegar na Itália – incluindo a quarentena de 10 dias –  e ao final exortaram todos a usar máscara, álcoo gel, e ter cuidado consigo mesmo e com os outros.

Como foi o encontro com o Papa Francisco na manhã de hoje?

O encontro foi um encontro muito bom, por conta que o Papa nos recebeu com todo carinho, com toda essa pessoa que ele é, foi sensível, sensibilizou a luta indígena nossa no Brasil, principalmente lá do Baixo Tapajós, e ele nos garantiu que é possível a gente construir uma agenda, aonde a gente possa discutir exatamente esse grande problema que hoje ocorre no Brasil, que é possível a gente fazer aliança, que essa aliança seja feita entre nós do Brasil, a população indígena, e a liderança que ele é hoje aqui no Vaticano. Então ele deu uma esperança muito boa para gente, que a gente vai construir uma torre de liderança, que essa torre de liderança possa discutir exatamente esses grandes empreendimentos que ocorrem no Brasil.

 

Foto: Vatican News

 

Teve uma dança e um grito especial durante o encontro, é isso?

Foi muito legal, por conta que nós dançamos o Surara e o Papa Francisco entrou na roda com a gente, segurou na minha mão, e a gente conseguiu dançar o Surara, que nada mais é do que esse tom aqui…[canto indígena]. O Surara significa ‘somos guerreiros, eu sou guerreiro’ (…) significa que o Papa Francisco é um guerreiro forte aqui no Vaticano. Esse é o significado. E tem o grito ‘Surara!’, somos fortes.

Hoje vai ser votado no STF o marco temporal. Como vocês estão acompanhando a mobilização em torno da votação, que teve inclusive o apoio nesses dias da CNBB, da REPAM, da CRB….

Estamos acompanhando, estamos bastante preocupados, porque está sendo discutido o futuro dos territórios indígenas, o futuro dos povos indígenas, porque se o STF referenda o marco temporal, significa dizer na prática de que todos os territórios indígenas, eles acabam sendo atribuído, criada regra geral para ter direito à demarcação de terra, os povos que estavam sob posse em 5 de outubro de 1988, quando foi promulgada a Constituição, o Brasil é signatário. E com isso é muito prejudicial por conta que a nossa história não começa em 88, nós estamos ocupando o Estado brasileiro muito antes da constituição do Estado brasileiro, nós já estávamos ali ocupando aqueles territórios. Então o STF precisa reconhecer a presença indígena no Brasil, precisa reconhecer os povos indígenas como pertencentes daquele território, o direito dos povos indígenas é um direito signatário, originário, e que o STF precisa referendar. E mais, a própria tese do marco temporal ela é inconstitucional. Vários juristas do Brasil já fizeram seus artigos de apoio, apontando a inconstitucionalidade da tese do marco temporal, há dois dias atrás, a ONU lançou um relatório também afirmando ndo e ponderando que o STF precisa julgar pela inconstitucionalidade da tese do marco temporal, porque a ONU também entende de que o marco temporal é uma tese inconstitucional para os povos indígenas no Brasil.

Como vocês veem o apoio da Igreja Católica à causa indígena?

A Igreja Católica tem sua importância no mundo, tem suas influências no mundo, e no momento em que o cacique recebe um convite para se encontrar com Papa Francisco, onde o Papa Francisco assume o compromisso em criar uma aliança pela defesa e a manutenção dos direitos originários dos povos indígenas, dos povos tradicionais, isso é muito importante porque a Igreja nada mais, nada menos, do que está reconhecendo o seu papel social, não só o papel religioso mas seu papel social para com os povos, que há muito tempo foram dizimados e invisibilizados.

 

Foto: Vatican News

 

Nós estamos vivendo este período de pandemia. Como foi para chegar à Itália para este encontro no Vaticano e como está a situação da Covid em sua aldeia…

Desde que a gente saiu da aldeia, aí chegamos na Cidade de Santarém, a gente teve que fazer exame de Covid, fizemos exames em São Paulo, aí depois fizemos quando chegou aqui na Itália, e todos os exames foram negativos, e quando eu cheguei aqui na Itália a gente teve que ir para a quarentena de 10 dias. Após a quarentena a gente voltou a fazer exame de novo, testou negativo e para entrar aqui no Vaticano também tivemos que fazer o exame, graças a Deus deu tudo certo, deu tudo negativo.

Nesse momento de pandemia na aldeia, a gente está seguindo as nossas próprias regras culturais, e a gente teve um grande problema que por conta… no início nós tivemos 40 pessoas na aldeia que foram vítimas da Covid, mas daí temos uma grande que é que a minha mãe, Edite Alves de Souza o nome dela, e ela com outro pajé, andaram fazendo os remédios caseiro e graças a Deus nenhum indígena precisou ir para o hospital de Santarém, para que recebesse intubação, graças a Deus ninguém veio [foi ]e a gente só tratou, a mamãe, só tratou lá com os remédios caseiros que tem no próprio território. Então a sabedoria ancestral, voltada à medicina tradicional, ela foi positiva e graças a Deus todo mundo ficou bom, não deixou sequelas em ninguém e hoje a gente tá feliz, porque temos nossos saberes culturais que não deixa de somar com os saberes científicos. Mas a gente como a gente exige respeito da sociedade, nós também respeitamos a sociedade. Aí é por isso que eu concordei em fazer essa quarentena de 10 dias e a gente cumpriu a quarentena tudo na paz, tudo deu certo, espero sucesso a todo mundo, mesmo lá do meu país e aqui do país Vaticano e peço a todos, por favor: “Você que tá ouvindo neste momento, use máscara, use álcool gel e tenha cuidado que o que está em jogo não é a vida dos outros, mas é a nossa própria vida, a minha,  a sua, a de todo mundo, vamos se cuidar.”

Fonte: Vatican News

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Custódia São Benedito da Amazônia realiza sua Assembleia Anual 2021

Com quase cem por cento da participação dos frades, a Custódia São Benedito da Amazônia realizou sua assembleia anual, de maneira virtual, nos últimos dias 05 e 06 de agosto. Desde o ano passado, tentou-se realizar o evento que, por conta da pandemia da COVID-19 havia sido adiado por duas vezes. Uma equipe de frades, liderada pelo secretário custodial, Frei Elder Almeida, pensou, organizou e conduziu a assembleia que foi avaliada como muito positiva pelos frades.

Ainda que de forma virtual, os membros de cada fraternidade reuniram-se em um mesmo ambiente da casa que foi preparado com antecedência, desta forma, a assembleia trouxe para todos um clima próprio, na alegria de estar juntos e no reencontro com os irmãos. Para a equipe que preparou a assembleia, uma grande preocupação foi a internet, visto que a região amazônica ainda não dispõe de um provedor eficiente. Mesmo assim, poucos foram os momentos em que ocorreu algum problema de conexão.

O primeiro dia da assembleia foi embalado por um texto produzido e apresentado pelo guardião da Fraternidade de Sant’Ana em Itaituba, Frei Francisco Paixão. O texto (que você poderá conferir no final da matéria) teve como pano de fundo a sua experiência nestes tempos de Pandemia. Ele conseguiu, através de seu texto e experiência, contemplar todos os confrades, referindo-se a situações vividas por ele, que muito se assemelhavam aos demais religiosos. Frei Paixão apresentou sete lições aprendidas durante este período e estas lições depois serviram de referência durante as partilhas das outras fraternidades.

Cada fraternidade teve a oportunidade de socializar sobre a vida e missão durante a pandemia. Estes relatos foram cheios dos mais diversos sentimentos: empolgação, emoção, alegria, tristeza, entusiasmo, desapontamento, mais sobretudo, de esperança. Para o guardião da Fraternidade de Sant’Ana em Óbidos, Frei Jacó Paiva, “o coração se alegra por termos passado por tantos desafios durante esses últimos meses, mas termos a oportunidade de estarmos vivos, e agora olhando um para o outro ainda que através de uma tela.” Algumas fraternidades participaram desta socialização apresentando fotos e vídeos, além dos testemunhos.

Para Frei João Messias, moderador das partilhas durante a assembleia, “realmente foi prazeroso escutar os irmãos e saber que nós não estamos sozinhos. É bom saber que a minha situação é muito parecida com a do meu confrade e vice-versa. Estas partilhas de experiências nos ajudam a ficarmos mais próximos uns dos outros.”

Durante o segundo dia da Assembleia, o Ministro Custodial, Frei Edilson Rocha, apresentou uma memória dos encaminhamentos das decisões do Capítulo Custodial 2019. Muitas destas decisões foram impossibilitadas de serem realizadas, por conta do contexto de Pandemia. O ministro pediu empenho e criatividade dos frades para encaminhamento dessas atividades para que, até o Capítulo Custodial, a ser realizado em outubro de 2022, algumas destas atividades sejam executadas.

Frei Edilson também apresentou uma síntese sobre o Capítulo Geral da Ordem do qual ele e Frei Rômulo Canto participaram em julho. O documento final do Capítulo Geral, que deverá sair brevemente, ajudará a Custódia na execução de algumas atividades. O Ministro da Custódia voltará a realizar suas visitas fraternas a partir da segunda quinzena de agosto e buscará juntos aos confrades caminhos para que se possa realizar as decisões capitulares. Assembleia Custodial virtual, foi concluída com o agradecimento do próprio Ministro Custodial a todos que se empenharam na realização do evento e de todos que se esforçaram para participar.

 

Texto: Frei Erlison Campos, OFM

 

 

As lições que tirei destes tempos pandêmicos

Me foi pedido para escrever uma reflexão para o início da Assembleia Custodial tendo como pano de fundo a minha experiência destes tempos de Pandemia. Me surpreendi pela solicitação, porque com certeza outros confrades poderiam discorrer melhor. Porém, creio que a coordenação me escolheu justamente pelas diversas experiências que vivi nestes 17 meses passados, desde a irrupção da Pandemia do Covid19 no Brasil.

Outro dia li um artigo de uma comunidade religiosa sobre as lições que a pandemia deixa para nós consagrados. Me senti incluído naquela reflexão. É a partir desta reflexão que compartilho com vocês as lições que tirei das vivências da pandemia e que com certeza vocês também viveram.

Primeira lição: Cada pessoa é um dom. Tanto no ERFRAN (um mês entre 20 irmãs e alguns irmãos!) quanto em Belém (2 irmãos mais jovens e 1 senior) percebi que pouco sabemos das suas alegrias, histórias, sofrimentos, valores, visões, sonhos, dos nossos “irmãos de fraternidade”. A pandemia oportunizou tempo para encontro pessoal, de descobrir o outro, de escuta, convivência, partilhas maiores (feita na mesa fraterna).

Segunda lição: Valor da fraternidade. Se cada confrade é um dom, quando vivemos de fato em fraternidade temos a possibilidade da descoberta de tantas qualidades, serviços, aptidões, gostos etc. colocados em comum, a serviço de todos. As irmãs, dispensam comentários, elas cuidaram bem disso lá no encontro. Em Belém foi maravilhoso poder partilhar nossos dons. Devido ao isolamento social, em Belém (e em outras fraternidades também) tivemos que dispensar as funcionárias, aí fomos para cozinha: confesso que aprimorei meus conhecimentos culinários e outras artes. Mas não apenas eu, meus confrades também revelaram seus dons. Rezamos juntos, refletimos juntos…

Terceira lição: A Morte como vida. Todos os dias rezávamos por vítimas da Covid. Nunca celebrei tantos sétimos dias. Daí um despertar para os valores vitais, como os cuidados com a saúde, valorização dos cuidadores de nossos frades idosos. Portanto, falar da morte é falar da vida. Tomar cuidado para não pegar nem transmitir o vírus, usando máscaras e álcool-gel e evitando saídas desnecessárias de casa e aglomerações.

Quarta lição: Meio ambiente. Naqueles meses em Belém despertou em mim um maior amor no cuidado e proximidade com o meio ambiente. Junto com a Nonata – uma entusiasta das plantas – criamos a “hortinha de alpendre franciscano” … “Brincando-brincando”, comemos tomates cereja e legumes da horta em apenas 2 canteiros e alguns vasos. O mais bonito foi influenciar outras pessoas da paróquia a fazer o mesmo, até em apartamentos. Começamos até a criar minhocas pra produzir húmus e adubar as plantas.

Quinta lição: Solidariedade. A vida nos ensina que quanto maior a necessidade, o sofrimento humano, a vida ameaçada, as catástrofes, etc., surgem e aumentam gestos de solidariedade, de ajuda mútua. Fomos solidários com as familias pobres em Belém e entre nós na fraternidade, especialmente com as celebrações que são tantas na paróquia.

Sexta lição: Desigualdades sociais. Na pandemia, pudemos sentir ainda mais as diferenças entre as pessoas e comunidades com o mínimo de condições vitais e aqueles que possuem recursos demasiados. Eis os desafios para reconhecer estas realidades e buscar juntos soluções, pistas, mudanças econômicas e estruturais, sistemas educacionais. Propostas novas e respostas são necessárias.

Sétima lição: Repensar a vida e a convivência social. Há tantas outras pandemias que perduram entre nós: fome, migração, destruição da Amazônia e seus povos, doenças endêmicas, condições subumanas de vida, violência, desrespeito aos direitos, etc. A pandemia maior que nos damos conta que precisa ser curada é o individualismo e o egoísmo, a começar pos nós mesmos. A humanidade não vai ser mais a mesma coisa, tampouco a vida religiosa consagrada. Daqui para frente será diferente o jeito de ser e de se relacionar com o mundo. O sentimento de medo existe, pois ele é inerente ao ser humano; mas é necessário seguir em frente, com fé, esperança e amor, e disponibilidade para vivenciar novos tempos.

Portanto, Irmãos, vamos começar… o resto vocês já decoraram!

Paz e Bem.

Texto: Frei Paixão, OFM

Confira algumas fotos do evento:

Fotos: Equipe Custodial de Comunicação