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3º Domingo da Páscoa

Para quem ama, a experiência da morte é muito dolorida. Perder um familiar, mãe, pai, filho, filha, esposa, marido ou até um amigo nos traz uma grande tristeza. Diante da morte, há um forte sentimento de perda e de saudade. Sentimos a ausência de uma pessoa querida, mas a saudade é mais que sentir a ausência, é experimentar um grande vazio e o desejo de ficar do lado da pessoa, de ter a pessoa fisicamente presente.

Mesmo sabendo que a morte é o destino da nossa existência, ficamos inconsolados com o fato que nunca mais teremos a pessoa amada do nosso lado.  Vivemos esta realidade durante a pandemia de COVID-19. Foi um momento em que a morte estava pairando sobre nós e o medo fez com que a possibilidade da morte se tornasse mais próxima. Mas é justamente nesta hora de dor, tristeza e de medo que a fé toma conta do nosso ser. A fé não somente nos consola, mas nos traz uma grande esperança de que a morte não tem a última palavra, pois a vida sempre é a vencedora.

Os discípulos estavam caminhando de Jerusalém a Emaús, uma caminhada de onze quilômetros, e invadiu no íntimo deles uma profunda tristeza. Experimentaram bem de perto a morte de Jesus e, com medo, fugiam de Jerusalém e no caminho conversavam sobre os últimos acontecimentos.  Embora estivessem no caminho, estava abandoando o Caminho.

Naquela conversa havia um sentimento de tristeza e saudade, um grande vazio dentro deles. Lembravam as ações de Jesus, um profeta poderoso em obras e palavras e que este Jesus, entregue nas mãos dos sumos sacerdotes, foi morto de uma maneira cruel, crucificado. As saudades era tantas que não eram capazes de reconhecer Jesus que começou a caminhar com eles, parecia um estranho.

Na conversa, Jesus falava das Escrituras e eles sentiam uma nova esperança com suas palavras. Foi quando entraram na casa e Jesus partiu o pão que os olhos deles se abriram e reconheceram Jesus, mas Ele desapareceu do meio deles. Diziam: “Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” (Lc 24, 32).

Enquanto caminhava com eles, Jesus ressuscitado estava fisicamente presente e eles matavam as saudades pelo jeito que ele explicava para eles as Escrituras. Mas agora, na partilha do pão, Jesus desaparece, não há mais a necessidade da presença física de Jesus, pois ele continua presente entre aqueles que acreditaram através dos seguintes sinais:

Presente, primeiramente, na Palavra, pois Jesus não é somente o cumprimento das Escrituras, mas ele mesmo é a Palavra que habita entre nós. Na escuta e vivência desta Palavra é que experimentamos a sua presença entre nós.

Segundo, na Eucaristia, pois ao partir o pão, Jesus repete o gesto da última ceia e lembra que os discípulos devem fazer isto em sua memória. No pão partilhado na vida comunitária e no pão abençoado do seu corpo e sangue, a comunidade de crentes recebe o alimenta para viver a fé e Jesus continua presente dando-nos o alimento que precisamos para a missão. Na comunidade, a partilha do pão eucarística é também indicação do pão partilhado na vida comunitária. Quem vive a partilha, se compromete em comunidade, e na comunidade Jesus ressuscitado está presente.

Depois, na missão, pois os discípulos, ao reconhecer Jesus na partilha do pão, imediatamente saíram em missão para contar aos outros que viram o Senhor. Assim começa arder o coração, pois Jesus caminha com a comunidade que vive a missão.

Diante da situação atual que estamos vivendo, o evangelho do caminho de Emaús nos ensina uma grande lição: Jesus ressuscitado não é um “estranho”, mas é nosso companheiro no caminho que restaura nossa esperança e nos anima para a missão.

A primeira comunidade cristã não precisava mais da presença física de Jesus, pois acreditava que Jesus estava presente na Palavra, na partilha do pão e na vida em comunidade.  Jesus não somente caminhava com eles, mas continua caminhando conosco nos mesmos sinais.

Podemos dizer que Jesus, ao caminhar junto, manifesta a solidariedade com todos aqueles que andam tristes e abatidos pelos acontecimentos. A presença de Jesus ressuscitado nos fortalece e nos encoraja também neste momento de dúvidas e incertezas, pois esta presença nos dá a certeza de que fomos resgatados, “não por meio de coisas perecíveis como a prata e o ouro, mas pelo precioso sangue de Cristo” (1Pd 1, 18-19).

É por isso que temos esperança de que podemos vencer as garras da morte, do mal e do medo. Cristo continua presente entre nós, e nós, comprometidos na comunidade podemos viver a certeza da ressurreição mesmo diante dos sinais da morte presente no mundo de hoje. Temos, portanto, os mesmos sentimentos dos discípulos que fizeram o encontro com Jesus no caminho:  “Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras”.

Frei Gregório Jorieght, OFM

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Anunciação do Senhor: celebrar as maravilhosas surpresas de Deus

Anunciação: Pintura de Guido de Siena. Fonte: Wikimedia Comms

Durante o tempo espiritual da sagrada quaresma, celebram-se duas solenidades: São José, esposo da Virgem Maria e a Anunciação do Senhor. A primeira exalta a pessoa do último dos justos do Antigo Testamento que vive pela fé. A segunda exalta a grande misericórdia da parte do Senhor para com toda humanidade no encontro com Maria que através de seu sim, Deus reergue a humanidade decaída em Adão e Eva. 

A Anunciação e o Mistério Pascal

Numa antiga tradição medieval fala-se de uma feliz coincidência com o dia 25 de março. Simbolismo que Jacopo de Varazze, em sua Legenda Áurea, recorda com versos populares que diziam: “Salve, dia festivo, remédio de nossos males, /No qual o anjo foi enviado, Cristo crucificado, / Adão criado e caído no pecado…”  No mesmo dia em que o Filho de Deus entra no mundo, também 33 anos depois, num 25 de março, teria doado a sua vida morrendo na cruz. Dessa forma, Encarnação e Redenção coincidem na mesma data. 

O porquê dessa data: na terra de Jesus, o dia 25 de março é o início da primavera. Quando celebramos a vida de alguém dizemos que é o início de uma nova primavera. Nesse dia, o Filho de Deus é gerado no mundo. Também ao fazermos nossa páscoa definitiva somos gerados para a vida nova junto de Deus. Com a morte se dá também uma nova primavera. Jesus é gerado e vem na primavera do mundo. Jesus morre na cruz e é uma primavera também, porque é a primavera da nossa salvação. Na cena da Anunciação Maria responde ao anjo: “Eis aqui a serva do Senhor”. Jesus 33 anos depois no calvário: “Pai em tuas mãos eu entrego meu espírito”.

Celebrar a Anunciação do Senhor é recordar que nossa vida só tem sentido quando a oferecemos em sacrifício a serviço dos irmãos como fez Maria pondo-se a caminho e Jesus culminando no suplício da cruz: “Tendo amado os seus, amou-os até o fim”. Exultamos de alegria com a Anunciação do Senhor. Daqui a nove meses estaremos celebrando o Natal do Senhor e podemos dizer: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós”. Deus nos surpreende sempre. Aliás, nosso Deus é o Deus da surpresa. A encarnação do seu Filho acontece de forma quase despercebida, numa pequena e humilde casa em Nazaré. Deus se revela na simplicidade e o ser humano continua a trilhar caminhos de grandeza.

Fonte: Wikimedia Commons

 

O dom da Simplicidade

A solenidade da Anunciação nos faz celebrar o dom dessa simplicidade de um Deus que nos vem visitar e começa sua missão no ventre de Maria. Logo de início, perturbada com as palavras não compreendidas por parte do arcanjo Gabriel, mas que depois abre seu coração e acolhe a vontade do Senhor. O Espírito Santo atua em Maria na missão de gerar o Filho de Deus. Deus se compadece da humanidade. Ele está sempre do lado dos mais oprimidos e pobres. Reconhece a dor e as angústias de cada pessoa. Envia seu próprio Filho que se faz carne e habita entre nós em definitivo. Mostra dessa forma que não estamos sozinhos e que sempre nos escuta.

Ao longo da história da salvação acompanhamos a ação misericordiosa de Deus através de seus enviados que contrasta com a dos poderosos e opressores de cada época. O texto-base da Campanha da Fraternidade 2023 nos faz refletir sobre o comportamento dos mais poderosos para com o povo. Um comportamento que revela abandono e exploração por parte das lideranças religiosas e políticas. Em Jesus vemos a atenção e o cuidado que com certeza recebeu da escola de Nazaré, de Maria e José. Maria que educou e cuidou com ternura de Jesus em suas fragilidades e que agora o vê se tornar um homem de compaixão e amor atento aos mais sofridos e marginalizados de seu tempo, participa também das dores e incompreensões de seu filho por parte das lideranças e também do povo.

Que a Virgem Maria, também protagonista dessa linda história de amor, a mesma que estava em Nazaré dando sim a Deus na presença do arcanjo Gabriel e estava aos pés da cruz, no calvário, dizendo o seu sim extremo à vontade divina, nos ajude também a fazer com que as nossas vidas sejam alinhadas com a vontade de Deus. Que possamos alinhar o nosso coração desajustado e dizer com Jesus, servo obediente, e com Maria, humilde serva do Senhor: “Faça-se a vossa Vontade”.

 

Frei Haroldo Pimentel e Frei Leandro Kamal 

 

 

Referências


CNBB. Texto Base da Campanha da Fraternidade 2023: Fraternidade e Fome. Brasília: Edições CNBB. 100 p.   

VARAZZE, Jacopo de. Anunciação do Senhor. In.: ______. Legenda Áurea. Trad. Hilário F. Júnior. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 317. 

ImaculadaConceição

Celebrar a Imaculada Conceição no chão amazônico

Foto: Arquivo Custodial

Dia 08 de dezembro a Igreja celebra solenemente a Imaculada Conceição da Mãe de Deus. Essa celebração ocorre dentro do tempo do Advento no qual Maria é uma importante figura. Essa liturgia relembra também que a verdade de fé da Conceição Imaculada de Maria foi definida por Pio IX na mesma data, no ano de 1854. A importância local da solenidade pode ser vista no fato de a Virgem da Conceição ser a padroeira de duas arquidioceses da Amazônia brasileira, Manaus e Santarém. O povo dessas duas cidades nutre uma grande afeição pela Imaculada. Pretendemos com esse texto, pensar um pouco sobre como alguns aspectos da celebração desta solenidade nos fazem olhar para o mistério pascal de Cristo refletido no chão concreto da fé e da vida amazônica. 

Na oração do dia recordamos que Deus preparou “uma digna habitação para o seu Filho, pela Imaculada Conceição da Virgem Maria”. A imagem divina que transparece é justamente aquela do cuidado, d’Aquele que não desampara e prepara com amor a chegada do Verbo. Na mesma oração, os fiéis suplicam: “concedei-nos chegar até vós purificados também de toda culpa” pela materna intercessão de Maria. Esse pedido a Deus liga o povo ao caminho feito pela Virgem, e eles fazem então, hoje subir aos céus um grito. O reino de Deus, “que atua na história”, faz da Imaculada, Maria de Deus e Maria do povo.  Foi no seio materno de Maria, a Mãe da Amazônia, que “formou-Se Jesus, que é o Senhor de tudo o que existe” (Querida Amazônia, 111). Desse modo, a mãezinha que roga por nós é atenta ao caminhar dos povos da Amazônia.   

“No coração palpitante da Amazônia”, a celebração da Imaculada é uma festa de “santa emoção”, mas também de proclamação da fé. Momento de rezar e afirmar, como fazemos na oração sobre as oferendas, que a graça divina preservou Maria de toda culpa. Ao festejar a Virgem Maria, afirmamos o nosso sentimento de querer crescer no seguimento de Cristo, caminho, verdade e vida. Conduzidos por Maria a Cristo, declaramos como ela: “faça-se, ó Pai vossa plena vontade”. Ela é um atalho que ao seu Filho conduz!

Maria é a mulher toda bela (Tóta púlchra), e ela se mostra na Amazônia como “mãe de todas as criaturas na beleza das florestas, dos rios…” A explosão de beleza presente na região amazônica pode contar com o carinho protetor de tão boa Mãe. A beleza de tudo que a Amazônia encerra carece de admiração e cuidado, os quais podemos aprender com a Imaculada, que guardava tudo em seu coração. A Bendita entre as mulheres, que “intervém constantemente em favor do povo de Deus” (Prefácio), volta o seu olhar para os pobres da Amazônia. Ela que é “Mãe dos aflitos que estão junto à cruz” sofre também com seus “filhos ultrajados e na natureza ferida” (QA, 111). 

A primeira leitura desta solenidade nos recorda a queda humana no relato da Criação. Continuamos a ouvir a voz de Deus nos perguntando: Onde estamos? E no solo bendito da Amazônia podemos constatar que muitos ainda buscam ocupar o lugar de Deus e “sentem-se donos da obra do Criador”. Essas tentações produzem feridas abertas no coração humano e no seio da floresta. Ao encontro disso, observamos o que suplica a oração depois da comunhão ao pedir que a “Eucaristia cure em nós as feridas do pecado original”. Portanto, que a celebração da Imaculada Conceição, aumente sempre mais a nossa fé no Cristo que caminha conosco na Amazônia. 

Frei Fábio Vasconcelos, OFM.

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O Advento da Igreja Sinodal

Foto: Arquivo da Custodia

 

O tempo do Advento nos traz uma mensagem de esperança e nesta caminhada sinodal também sentimos a alegre expectativa pelo novo que vem. Ressoam fortes a ideia do Reino que veio e que vem, na encarnação e parúsia. As duas vindas de Cristo nos colocam em um caminho na história e para além dela, que a Igreja pretende trilhar de forma sinodal. Sinodalidade é uma expressão que evoca o caminhar juntos. A palavra advento nos dá a ideia de presença permanente, Deus que vem, e a nossa chegada até Ele. Temos então um percurso para comunhão no “achegar-se” junto dele que vem ao nosso encontro. O Advento do Senhor é advento da Igreja nova.  

O Advento é um tempo caminhante para a novidade que Deus nos prepara. Tempo de escuta, comunhão e missão. Os textos bíblicos nos remetem à preparação dos caminhos do Senhor e da Igreja que com Maria se põe na estrada do serviço. A gestação sinodal deve dar à luz a alegria de uma comunidade que sempre se renova, como o menino Deus. O advento é um tempo de escuta e preparação, assim como a caminhada sinodal nos coloca a necessidade de ouvir os clamores de Deus e os sinais dos tempos. Essa irrupção de Deus na nossa humanidade é como vento que sacode as coisas. Preparar os caminhos do Senhor, implica hoje no caminhar juntos. 

 

Compartilhamos os sonhos e esperanças, mas também os sofrimentos e incertezas. O apelo a caminhar juntos nestes tempos de luto e sofrimento nos convida a sermos semeadores da esperança. “Muito suspira por Ti” é um canto de autoria de Geraldo Leite Bastos que sintetiza bem essa expectativa em conjunto. Esperamos o Santo Messias em comunhão, participação e missão. A nação que sofre junto, a qual “enchem de dor”, também é aquela que espera e luta por novos tempos. A Igreja no advento deste sínodo é chamada a “fazer germinar sonhos, suscitar profecias e visões, fazer florescer a esperança, estimular confiança, enfaixar feridas, entrançar relações, ressuscitar uma aurora de esperança, aprender uns dos outros e criar um imaginário positivo que ilumine as mentes, aqueça os corações, restitua força às mãos” (Papa Francisco, 2018). Somos aqueles que no espaço do Advento se põem a mirar o sol que nasce da aurora. Estamos nos passos daquele “novo que sempre vem”, como cantam os nossos artistas.

Outra imagem coletiva do Advento é a de um povo em expectativa. “Jerusalém, Povo de Deus, Igreja santa, levanta e vai, sobe as montanhas, ergue o olhar” (Reginaldo Veloso) é o que cantamos numa união sinodal, para recordar que somos um povo que caminha junto na esperança. “Este povo que escolheste, sua sorte melhoraste”, tomado da expressão do salmista, nos lembra que vamos trilhando o Advento da comunhão. Essa eleição não é exclusivismo, mas serviço e testemunho universal. A alegria é outra tônica deste tempo, uma feliz espera e caminho sinodal com suas releituras e mudanças nos enche de felicidade. É a alegria de um encontro com o Senhor e os irmãos.  

Esperamos que esse tempo do Advento vivido em chave sinodal nos ajude a perceber que partilhamos esperanças no caminho com o Senhor. Nesta oportunidade da vida eclesial somos convidados a mudar os nossos passos para acolher o Reino. Percebamos que estamos no Advento de uma “Igreja sinodal” que acende as luzes da escuta, comunhão, participação e missão e o sonho do fim do clericalismo que imbeciliza e do autoritarismo que atrofia.

Frei Fábio Vasconcelos, OFM

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Relação entre liturgia e missão na Amazônia

Batizado na Missão Cururu. Foto: Maribeth Joeright

O encontro entre Liturgia e Missão 

O discipulado e a missão brotam do encontro pessoal com o Senhor e a liturgia é, sem sombra de dúvidas, um lugar privilegiado para esta experiência com Cristo. Encontramos Cristo de muitas maneiras na Liturgia. No momento celebrativo entramos em diálogo e comunhão com o Ressuscitado que continua a impulsionar a missão da Igreja. Recebemos do Senhor o dom do Espírito e da vida nova que nos fortalece e insere no compromisso de sermos seus seguidores. O Mistério Pascal que celebramos é a existência total do Cristo. Nós, que somos discípulos de Jesus, partilhamos o anúncio do Reino na espera vigilante da sua volta. Outro dos elementos que caracterizam o discípulo-missionário é a comunhão que se expressa fortemente na união litúrgica (liturgia celebração) e na partilha da vida (liturgia vida).

 A Iniciação Cristã, que foi um dos temas chave do encontro de Aparecida, repensa a unidade entre catequese e liturgia, lembrando que ambas têm como fim a penetração nos mistérios do Reino. A vivência do Mistério se dá em uma relação entre liturgia e vida, entre celebração e testemunho. Ao relacionarmos liturgia e missão não podemos esquecer a preocupação e tarefa da inculturação litúrgica. O texto de Aparecida usa a expressão “nossos povos” para indicar que na nossa realidade não temos um povo único e em um mesmo país se expressam diferentes culturas. A Constituição Sacrosantum Concilium sobre a Sagrada Liturgia do Concílio Vaticano II (37, 40, 119…) falou diversas vezes dessa preocupação com a clareza dos ritos e com a sua adaptação às diferentes culturas, essa é uma forma de encarnar a missão da Igreja nos mais diversos ambientes.    

A liturgia é momento da história da Salvação, alimento para os seguidores e seguidoras do Ressuscitado. No entanto, a liturgia não esgota o fazer da Igreja, mas deve torna-se sua fonte e cume (SC 10). Ao celebrar o Mistério Pascal devemos nos questionar diante da Palavra de Deus e da realidade atual. O fazer “o que o Senhor fez” significa doar sua vida por um mundo melhor. Ao sairmos da celebração litúrgica (ite, missa est) somos enviados em missão, convidados e convidadas a glorificar o Senhor irradiando no mundo a sua paz e alegria (cf. rito de despedida da Missa).  

 

Foto: Arquivo Custodial

Liturgia e missão na Amazônia

Liturgia e missão estão fortemente unidas. Vemos que na liturgia temos a fonte e cume do agir eclesial (SC 10). Cada pessoa que celebra em cada lugar do mundo assume uma vida e compromissos próprios. Em cada liturgia se acolhe a palavra e o envio missionário. Observamos que existem liturgias próprias que enviam missionários ad-gentes, mas para além disso cada celebração faz de nós missionários do que ouvimos e realizamos. Nesse contexto é que queremos comentar um pouco sobre a relação entre liturgia e missão em ambiente amazônico. A Amazônia não é apenas terra de missão, mas espaço teológico e missionário que nos desafia a viver e celebrar o evangelho. Temos então um texto que pretende discutir esses aspectos e deixar-se navegar pelos sonhos e uma liturgia com rosto amazônico.  

No projeto do sonho eclesial recordamos que “a Igreja é chamada a caminhar com os povos da Amazônia” (QA, 61), isso é em sua vida e missão que contemplam também o celebrar. Esse caminho, do desenvolvimento do rosto amazônico da Igreja e, por conseguinte, da liturgia, passa por um reconhecimento da cultura do encontro, da harmonia pluriforme. Reconhecendo a diversidade e unidade nas diversas formas de celebrar o culto divino. No celebrar adaptado em um contexto amazônico se faz ressoar o mesmo mistério pascal e o grande anúncio missionário. Da liturgia se vai à vida e vice-versa porque não são partes contrárias do existir. Todo batizado, discípulo-missionário, encarna em sua vida os compromissos daquilo que acredita e celebra. Na Amazônia a liturgia e a missão assumem características próprias mediante as necessidades e culturas locais. 

 

Foto: Maribeth Joeright

 

Cristo, com sua presença nas ações litúrgicas (SC 7) nos indica o caminho, e como diz São Paulo VI, aponta para a Amazônia. A região amazônica é convidativa, acolhedora e se mostra como espaço aberto para viver e celebrar. No entanto, nos causa embaraço pensar que muitos de nossos irmãos e irmãs são privados de celebrar em cada domingo a Ceia Pascal do Senhor. A liturgia que em sua raiz é ação do povo, nos recorda os puxiruns indígenas e caboclos, que são imagens de um fazer em união, em um só coração. Liturgia nos recorda que temos uma missão e uma memória recebida.  São como fazer a “farinhada” de uma memória viva que recebemos e temos de atualizar no hoje. Assim, passamos a ver a missão da liturgia e a missão pela liturgia. Nessa ação contamos com a presença de Cristo, Ele é que restaura nossas forças, nos ensina e envia. Os compromissos da liturgia, memória que nos une a Jesus, nos lançam a buscar o bem viver da floresta e dos seus povos. 

A Boa Nova de Jesus se encarna nas culturas, estava lá sempre presente como fecunda semente. A Igreja que celebra de forma inculturada na Amazônia é embalada pela escuta e diálogo com as realidades e raízes locais. A anamnese de Cristo é esse mesmo diálogo entre o hoje e ontem, entre as múltiplas culturas e o Evangelho. Da imersão da liturgia nas culturas e dos passos da sua maior inculturação temos visto sinais. Na canoa da liturgia o remo da participação ativa, plena, consciente que gera frutos missionários tem sido uma grande ajuda. O sonho do Papa Francisco está no mesmo rio dos sonhos da Sacrosanctum Concilium. As mesmas bases do sonho eclesial se refletem ao tratar da inculturação da liturgia na Amazônia (QA, 81-84).  Querida Amazônia é profética ao afirmar: “O Concílio Vaticano II solicitou este esforço de inculturação da liturgia nos povos indígenas, mas passaram-se já mais de cinquenta anos e pouco avançamos nesta linha” (QA, 82). 

A liturgia na Amazônia, não fecha as portas da Igreja, mas a lança em saída, são a água refrescante de Igarapé e ponto alto da sua vivência. Na liturgia se pode comemorar as vitórias dos povos amazônicos junto da vitória pascal de Cristo. Os ritmos da terra e dos povos, o olhar contemplativo, o estupor diante da Amazônia são elementos de teologia e espiritualidade amazônica que devem se exprimir na liturgia. As culturas ao celebrar reafirmam identidade e valores, ou seja, a seu discipulado e missão, que configuram seu Ethos (Seu jeito de estar e agir no mundo). Tornamo-nos cristãos também através da liturgia e nos fazemos sempre mais pondo em prática cotidiana o que celebramos. Liturgia-vida e liturgia-celebração não podem desligar-se, num mundo onde tudo é interligado.      

Os povos da Amazônia sabem celebrar, se alegram com a união do divino com o cósmico, a graça e a criação, de modo particular ao participar dos sacramentos (QA, 81). Ao celebrar os sinais de Cristo nos unimos com a Criação, renovamos a ação de graças ao Criador e assumimos um compromisso com a natureza. Nossa humanidade e os elementos do universo são assumidos por Deus, que nos impele a um agir novo no mundo. O batismo é um forte sinal disso, batizados nas águas do Senhor, recordamos as águas da Amazônia também e nosso compromisso com rios e nascentes da região. Céu e a terra se unem no louvor que também assume os traços dos povos da floresta. A glória de Deus hoje é entoada na Amazônia quando nos comprometemos com a luta por direitos, preservação de identidade cultural, zelamos pela Criação e encarnamos o evangelho. 

Diante dos desafios colocados podemos sonhar também. E clamar que venha o rito amazônico como raiz da mesma liturgia católica. Que se adaptem de forma verdadeira os ritos em seus livros, musicalidade, gestual, ministérios e serviços. Do chão da Amazônia resplandeça sempre mais a linda missão dos seguidores de Cristo, que anuncia sua Páscoa até a sua vinda. A alegria do Senhor fortaleça os povos e a Igreja presente na Amazônia para que siga em seu compromisso de fé e vida. 

 

Frei Fábio Vasconcelos, ofm

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Referência
PAPA FRANCISCO. Querida Amazônia: Exortação Apostólica pós-sinodal. Brasília: Edições CNBB, 2020. 58p.
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Tapiri da Palavra: 23º Domingo do Tempo Comum – Ano B

 

Setembro é o mês que dedicamos à Bíblia e lembramos que é a Palavra de Deus que orienta e é luz para todo aquele que quer viver a fé em Deus. Ouvimos, semana passada, na carta de São Tiago que não queremos “ser meros ouvintes da palavra, mas praticantes”. Para que isto aconteça, é preciso duas atitudes fundamentais: os olhos abertos para enxergar a realidade em que vivemos e os ouvidos atentos para ouvir os apelos de Deus diante desta realidade. São essas atitudes que nos ajudam a descobrir como podemos ser cristãos autênticos e praticar a Palavra que ouvimos diante de tantos desafios que enfrentamos no mundo.

No livro do profeta Isaias escutamos a promessa de Deus: “é Ele que vem para nos salvar. Então se abrirão os olhos dos cegos e se descerrarão os ouvidos dos surdos” (Is 35, 4b-5). Deus quer que o povo seja capaz de enxergar e escutar a sua palavra, assim a “terra árida se transformará em lago e a região sedenta em fontes de água” (Is 35, 7ª). Nós, porém, muitas vezes ficamos cegos e surdos diante da Palavra que Deus nos dirige. Isto acontece por causa do nosso próprio pecado, pois é o egoísmo que não nos permite enxergar o sofrimento ao nosso redor e nem escutar os apelos de Deus. É justamente nosso pecado que nos fecha no nosso próprio mundo, ficamos de ouvidos fechados diante da proposta de Deus e de coração fechado diante dos irmãos e do mundo.

Todavia, há também outros motivos que nos levam a rejeitar a voz de Deus. É a maneira como a sociedade está organizada. Neste mundo, o que conta é o lucro e o crescimento econômico e não a vida. A riqueza e o poder de alguns, enquanto uma maioria continua na exclusão. Quando somos influenciados por estas atitudes e só visamos o nosso próprio bem, ficamos de olhos fechados e ouvidos cerrados diante da proposta de Deus.

No Evangelho Jesus está diante de um mutilado na sociedade, um surdo e mudo que representa os excluídos de ontem e de hoje e que tem dificuldade em falar, pois a sua voz não é ouvida e nem escutado. Jesus nos mostra uma nova atitude. Não é somente curar o homem, mas recuperar a sua dignidade e o reconhecimento do seu valor e da sua missão. Jesus leva o homem para longe da multidão, lá com gestos ele toca nos ouvidos e na língua, e depois de pronunciar a palavra “Efata”, os seus ouvidos se abrem e a sua língua se solta. É a palavra que realiza a cura e transforma a vida. Esta mesma palavra “Efata”, é usada na cerimônia do Batismo para dizer que o cristão precisa abrir os ouvidos para ouvir e solta a língua para falar. Significa que a cura de Jesus é para todo o batizado.

Depois da ação de Jesus, o surdo mudo começa a divulgar o fato com muita insistência, pois é no anúncio da palavra e no testemunho da vida que todos podem reconhecer: “Ele tem feito bem todas as coisas”. Esta afirmação feita pelo povo que testemunhou a ação de Jesus nos lembra que, no ato da criação do mundo, Deus contemplava a sua obra e viu que tudo era bom, todas as coisas eram bem-feitas.

Falar da criação como obra de Deus é também lembrar da Amazônia que é um dos patrimônios naturais mais valiosos de toda a humanidade e a maior reserva natural do planeta. Hoje, 05 de setembro, é comemorada o dia da Amazônia. Conhecemos muito bem que a Amazônia é uma região abençoada por Deus, mas, apesar disto, é uma região mutilada pela ganância, pelo desrespeito e pela violência. Amazônia é o surdo e mudo que quer gritar, ser ouvido, é o excluído que grita: “A vida em primeiro lugar”.

Diante desta realidade, queremos ser curados por Jesus para enxergar a realidade mutilada pela ganância, para ouvir os apelos de Deus diante da realidade e para proclamar que toda a criação é obra de Deus, pois “ele fez bem todas as coisas”. Quando somos curados da nossa cegueira podemos manifestar nossa gratidão a Deus e assumir nosso compromisso de proclamar a Boa Nova de Jesus. Assim, vamos compreender as palavras do profeta Isaias: “A terra árida se transformará em lago, e a região sedenta em fontes de água”. (Is 35, 7a).

Frei Gregório Joeright, OFM

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Tapiri da Palavra: 22º Domingo do Tempo Comum – Ano B

Como pessoas de fé, todos nós rezamos e até sentimos a necessidade de rezar. Mas, por que rezamos e por que precisamos rezar? Muitas vezes sentimos a necessidade de rezar porque enfrentamos algum problema, na família ou de doença, ou fomos ofendidos e queremos nos livrar do rancor e do ódio. Pode ser também que sentimos uma grande insegurança na vida e precisamos pedir ajuda de Deus. Outro motivo, algo está errado na vida, tudo está dando ao contrário daquilo que queremos e precisamos pedir para Deus uma mudança nesta situação, ou simplesmente pedir a força de Deus. Também, pode ser que a vida ficou sem sentido e é necessário buscar a razão da nossa existência em Deus, assim queremos descobrir onde está Deus e entrar em sintonia com Deus. Talvez seja pelo fato que estamos buscando algo e não sabemos onde achar, por isso precisamos rezar.

De fato, a pergunta – “onde está Deus?” – acompanha todo aquele que crê, pois muitas vezes enfrentamos problemas, dificuldades, incertezas, somos tentados a fazer o mal, ficamos vazios e não sabemos onde achar Deus em nossas vidas.

No Exílio, antes do nascimento de Jesus, o povo perguntava: “onde está Deus?”.  Longe de sua própria terra e do templo onde cultuava Deus, este povo estava sofrendo uma grande escravidão. Perdeu a sua identidade como povo, sentia a necessidade de rezar, de achar Deus porque existia um grande vazio na vida deles.

O autor de Deuteronômio responde: “Agora, Israel, ouve as leis e os decretos que eu vos ensino a cumprir, para que, fazendo-o, vivais e entreis na posse da terra prometida… guardai os mandamentos do Senhor vosso Deus… e os poreis em prática, porque neles está vossa sabedoria e inteligência perante os povos…” (Dt 4, 1.6). É justamente através destas leis e destes decretos que Deus se manifesta como um Deus fiel e grande que sempre está próximo do seu povo.

Mas não é qualquer lei – são leis e decretos justos que fazem brotar a justiça. Aí São Tiago diz: “A religião pura e sem mancha diante de Deus Pai é esta: assistir os órfãos e as viúvas em suas tribulações e não se deixar contaminar pelo mundo” (Tg 1, 27). Religião então significa solidariedade com os marginalizados e nos guardar sempre contra o mal da mentira, ganância, vingança e corrupção deste mundo. Diante de tudo isto, ainda continua a pergunta: “onde está Deus”?

Jesus nos ajuda a compreender: Para os fariseus e mestres da lei, Deus estava no cumprimento da lei da aparência: “Com efeito, os fariseus e todos os judeus só comem depois de lavar bem as mãos, seguindo a tradição recebida dos antigos” (Mc 7, 3). Jesus cita Isaias: “este povo me honra com os lábios, mas o coração está longe de mim. De nada adiante o culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos” (Mc 7, 6). E Jesus ainda diz que a maldade, os roubos, as mentiras e a ambição veem de dentro de nós e são eles que tornam o homem impuro. Em outras palavras, é preciso inverter a lógico do mundo, pois a lógica de Deus é diferente e somente podemos entender quando somos capazes de sermos praticantes da palavra e não meros ouvintes.

Então, a pergunta: “Onde está Deus e como achar Deus?”, é atual para nós hoje. Para muitas pessoas, o lugar para achar Deus é na igreja, mas será que podemos encontrar Deus em outros lugares?

Para sentir a presença de Deus em nossas vidas é necessário rezar e escutar a voz de Deus no nosso cotidiano. Rezar e entrar em sintonia com Deus, com sua vontade e suas palavras para que não sejamos meros ouvintes, mas praticantes da religião pura e sem mancha através da solidariedade e da vivência do amor enfrentando todas as maldades do mundo para descobrir que Deus sempre está do nosso lado. O salmista de hoje então responde nossa pergunta: “onde está Deus?”: “Senhor, quem morará em vossa casa e no vosso monte santo, habitará? É aquele que caminha sem pecado e pratica a justiça fielmente; que pensa a verdade no seu íntimo e não solta calúnias com sua língua. Quem em nada prejudica o seu irmão, nem cobre de insultos seu vizinho; que não dá valor algum ao homem ímpio, mas honra os que respeitam o Senhor”. (Sl 14(15) 2-4).

Frei Gregório Joeright, OFM

 

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Celebrar a Assunção de Maria e assumir a Amazônia

Assunção: assumir e celebrar um compromisso

A palavra “assunção” tem sua origem no termo latino “ad-sumere”, que significa “assumir, tomar para si”. Deste modo, a Assunção de Maria é uma celebração na qual Deus toma para si, acolhe de corpo e alma a Virgem Santa à glória celestial. O Papa Pio XII, em 1950, ao definir a “Assunção de Maria” como um dogma da Igreja Católica, recorreu ao testemunho litúrgico, que celebrado desde antiquíssimos tempos, tem sido uma fonte de luz para a vida do povo. Ele recorda os sacramentários e outros textos litúrgicos bem antigos da digna veneração da Divina Providência, que honrou e libertou Maria da prisão do túmulo. Maria, que sofreu a morte temporal, não ficou presa nas algemas da morte.

Da liturgia à vida, pode-se afirmar que essa festa conclama toda a pessoa a olhar para a nova Mãe de toda a Criação como mulher do novo paraíso. Maria desfruta do convívio que os primeiros humanos perderam. Maria é participante da reconciliação celebrada pelo Filho. Esta solenidade que a Igreja do mundo todo celebra toca também o chão da nossa vida amazônica, e pode nos ajudar a pensar sobre o agir de Deus entre nós. Ao celebrar essa “passagem” ou “dormição”, que eram os primeiros títulos dados a essa liturgia no Oriente, de Maria se recorda que a Mãe do Senhor, após sua vida terrena, foi assunta aos céus de corpo e alma pelo seu próprio filho Jesus. Na totalidade de Maria se assume também a nossa humanidade, nossas culturas, nosso jeito de ser.

“Amazonizar” a liturgia da Assunção

Este dogma mariano tem uma estreita ligação com o dogma da “Imaculada Conceição” da Mãe de Deus, nos quais se ressaltam “a partida e o destino” pleno de Maria. Em configuração com seu bendito Filho, o Ressuscitado, Maria é envolvida na vitória pascal. Foi ela quem gerou de modo maravilhoso a Jesus e, de maneira inflável, foi assunta aos céus. Maria, do “começo ao fim”, foi plena de graça. Essa imagem gloriosa poderia afastar Maria de nós? Ao contrário, o que se celebra é que a humildade de Maria foi assumida no céu. A bendita Mulher de Nazaré vai ao céu por inteiro, corpo e alma, levando consigo a história e cultura de um povo e, conjuntamente, de todos os seres humanos. A oração do dia nesta solenidade nos indica a viver em atenção às cosias do alto, o que de modo algum é viver em alienação. Esse caminho do céu e terra, e vice-versa, faz-se sonhando com uma Amazônia melhor. Somos novamente convidados a olhar os sinais dos tempos, os alertas de hoje, no céu e na terra da região amazônica.

No Prefácio da solenidade, que vem intitulado de “a glória de Maria”, a Virgem aparece como sinal da Igreja que caminha rumo ao reino. Aurora e esplendor são expressões de cunho luminoso e cósmico, referem-se à luz que desponta e que brilha vivamente. Maria está no começo e na plenitude do viver em Deus. A oração prossegue nomeando a Virgem como “consolo e esperança do povo” que deseja a glória eterna. Nesse texto litúrgico também se pode contemplar que foi por obra do Autor da vida, Deus cheio de amor e poder, que Maria foi preservada da corrupção da morte. Podemos ver então uma relação entre a Mãe do Senhor e o povo de Deus.

Se assunção vem do termo assumir, lembremos do que precisamos assimilar aqui na Casa Comum: assumir uma eclesialidade amazônica, assumir nosso compromisso com o bem-viver, assumir nossos erros e preconceitos, precisamos que nossos gestos sejam “assuntos” para um novo céu e nova terra.  E podemos nos perguntar: Assumir a Amazônia para quê? O que significa acolher seus povos e culturas no seio da Igreja? As imagens do Sol e da Lua, que aparecem revestindo e calçando a Mulher-Igreja são imagens da nossa relação com o cósmico, de que nosso corpo é interação com o espaço e da interação entre nosso dia e noites amazônicos. Os luminares do céu são igualmente fortes nas culturas locais. Sol que brilha e o céu que não pode cair sobre nós, como imagens da catástrofe ambiental que pode nos assolar. Cantando nosso sinal, o sinal mulher, olhamos para nossas matriarcas amazônidas da Igreja que mantém de pé nossas comunidades (A mulher é a Igreja!). Estamos com Maria em uma canoa, navegando até o porto do eterno Amor.

Referência: ALDAZÁBAL, José. Vocabulário básico de Liturgia. São Paulo, Paulinas. 2013.

Texto: Frei Fábio Vasconcelos, OFM

Estudante de Teologia no Instituto Teológico Franciscano (ITF), Petrópolis – RJ.