Tapajós, dádiva e perigos nas águas na visão de um franciscano

Foto: Arquivo Custodial

Nós somos os filhos de Omama e por isso protegemos a terra que ele criou. Nossa maneira de trabalhar nela é diferente [da dos brancos]. Nossos rastros na floresta a deixam bonita como ela é. Não a desmatamos à toa, deixamos suas águas limpas. Ela sempre permanece clara, cheia de caça e de peixes. São estas minhas palavras. Uma vez escritas, espero que todas as pessoas que as ouvirem possam pensar: “Sim! Assim falam os filhos dos [antigos] habitantes da floresta! Essas são suas verdadeiras palavras! Não são eles que criaram essa coisa de mudança climática, é a nossa própria pegada no chão da Terra! Nós carecemos mesmo de sabedoria!” Se assim falarem entre eles depois de ver esses desenhos de palavras, ficarei feliz.

 Davi Kopenawa Yanomami, 2011

Começo este texto com essa citação da liderança Indígena Davi Kopenawa que Frei João Messias usou na dissertação de mestrado que tem como título CIMAT, DA’UK e WAKOBORUN: lutas, desafios e estratégias socioambientais de mobilização, de resistência e fortalecimento da identidade das organizações do povo Munduruku do alto Tapajós/PA. Não vou abordar tudo o que contém essa dissertação, mas vou fazer um recorte de um dos pontos abordados nela e que é comemorado neste dia 22 de março, O DIA MUNDIAL DA ÁGUA.

À água é o bem mais precioso que temos, parece bem clichê essa frase, mas ela é a mais pura verdade! E por que fazemos questão de não cuidar dela? Principalmente nós, que moramos na Amazônia e somos privilegiados com água em abundância. 

A Amazônia, tem inúmeros garimpos ilegais e eles são sem dúvidas uma das atividades que mais poluem os rios da região e consequentemente causam prejuízo ambiental, econômico e de saúde que são inevitáveis principalmente para os ribeirinhos e povos que vivem da pesca. Frei Messias relata que descobriu durante a vida que os ribeirinhos não só moram perto do rio, mas sobrevivem dessa água e sua pesquisa mostra dados alarmantes sobre o garimpo, principalmente na região de Jacareacanga no Pará, onde estão localizados vários povos indígenas, incluído o povo Munduruku, que foram os principais interlocutores na referida pesquisa.

Foto: Arquivo Custodial

Segue alguns dados encontrados na dissertação de mestrado do Frei Messias. “A atividade garimpeira não é recente na região, existe desde a década de 1970, mas especialistas e o próprio MPF vêm alertando para uma explosão da atividade ilegal seguida por violência desde 2019…. Como se trata de um território entrecortado por rios, os garimpeiros conseguem invadir, montar estrutura para extração do ouro e evadir-se com facilidade quando a polícia federal e/ou a força nacional realizam operações na área. O aumento de pontos de exploração, tem gerado altos níveis de contaminação de peixes e seres humanos por mercúrio e, consequentemente, causado o surgimento de outras problemáticas ao meio ambiente e à saúde humana” (SOUSA, 2023).

À água ela é primordial para a sobrevivência de todo tipo de espécie do mundo, mas os seres humanos fazem questão de poluir os rios por pura ganância, pois uma fatia muito pequena se beneficia da exploração de garimpos, por exemplo, e a maioria se prejudica com os danos ambientais que essa exploração deixa. Além do trabalho feito pelo frade, existem outras pesquisas da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), sobre a poluição da água. A pesquisa desenvolvida por  Frei Messias é destinada para o Alto Tapajós, mas o estudo da Ufopa, foca no baixo Tapajós, precisamente em Santarém, no Oeste do Pará. 

Um estudo divulgado em março de 2022 mostrou que 75% dos quase 300 mil habitantes da cidade de Santarém (PA) estão contaminados por mercúrio em doses acima das consideradas seguras pela Organização Mundial da Saúde. A pesquisa, realizada pela Universidade Federal do Oeste do Pará e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), mostra como esta substância perigosa está se espalhando rapidamente pelo país, principalmente pelo consumo de água e de peixes dos rios. 

Foto: Erik Jennings

De acordo com a pesquisa, essa contaminação por mercúrio é devida aos garimpos localizados em Itaituba. Então, não se trata somente em uma região específica que pessoas são prejudicadas e sim em várias partes. Estou focando esse texto na poluição dos rios pelos garimpos, pois é uma realidade de anos e que nunca as autoridades olharam para esse problema que afeta diretamente milhares de pessoas. 

Poderíamos ter feito um texto só falando de coisas boas que a água nos proporciona, como as belas cachoeiras que podemos desfrutar além das paisagens delas. Dos inúmeros benefícios que temos por causa da água e várias outras abordagens, mas decidimos falar da poluição para que esse assunto nunca caia no esquecimento. 

A água é um dom, mas também com os malefícios da ação predatória se torna um perigo. Nesse Dia Mundial da Água, pedimos que todos tenhamos consciência que se nós não cuidarmos, uma hora vai acabar e todos nós vamos morrer por falta de água limpa! E a culpa será exclusivamente nossa.

Foto: Arquivo Custodial

Sabrina Gonçalves 

Fontes:

  1. SOUSA, João Messias da Silva. (2023), CIMAT, DA’UK e WAKOBORUN: lutas, desafios e estratégias socioambientais de mobilização, de resistência e fortalecimento da identidade das organizações do povo Munduruku do alto Tapajós/PA. Dissertação para título de mestrado no programa de pós-graduação interdisciplinar em ciências humana mestrado acadêmico; Manuas (AM)
  2. https://www.ufopa.edu.br/comunicacao/comunica/jornalismo/ufopa-na-midia-2/2022/marco/garimpo-faz-explodir-contaminacoes-por-mercurio-no-brasil/
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